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A dinâmica familiar e a responsabilidade no tratamento do paciente glaucomatoso

Por Hissa Tavares – Especialista em glaucoma e catarata; Mestrado e doutorado em oftalmologia na Universidade de São Paulo; Chefe da oftalmologia da Universidade Federal do Ceará; Preceptora da residência de oftalmologia da Universidade Federal do Ceará

O trabalho do médico oftalmologista vai além do consultório, o controle pressórico é medido no consultório, mas para dar certo é preciso que o paciente e seus familiares tenham consciência da necessidade de seguir as orientações que vão desde uso de colírios, controle da diabetes mellitus (DM) e hipertensão arterial sistêmica (HAS) até retornos periódicos ao médico. Usando o trocadilho, precisamos colocar pressão nos familiares e pacientes, informando e reforçando sobre a gravidade da doença se não tratada corretamente, assim aumentamos a chance de termos controle adequado no consultório. Essa “pressão” precisa ser contínua, se o paciente perde uma consulta, ele pode passar anos sem voltar, eu costumo dizer que se o paciente esquece do médico, ele vai esquecer do remédio, no caso do colírio também.

Observo que nas famílias, nas quais o quadro da doença é mais amplo, quando acomete mais pessoas ou quando os poucos acometidos tem uma visão restrita, os pacientes tem mais receio de terem baixa visual importante, levam a doença mais a sério e sendo mais responsáveis com o tratamento. Além disso, os pacientes com baixa visual severa, “pressionam” os filhos a buscar acompanhamento desde cedo, alegando que se tivessem tido cuidado desde adultos jovens poderiam ter uma visão melhor.

Há mais de 10 anos a Sociedade Cearense de Oftalmologia (SCO) realiza em maio campanhas de informação e atendimento à população, buscando estar presente em locais acessíveis, como praças e shoppings. Nós observamos que nos meses seguintes existe aumento no número de atendimentos, mas infelizmente é cíclico, e nesse mundo acelerado uma doença que não provoca dor, nem incomodo no início termina caindo no esquecimento.

Quando falamos em glaucoma, pensamos em informar a população que a doença existe, infelizmente ainda é pouco conhecida, gostaria que fosse tão difundida como hipertensão arterial e diabetes. Essa informação precisa chegar a toda a população, em todos os lugares. A Sociedade Norte Nordeste de Oftalmologia (SNNO) busca unir as sociedades locais para que todas tenham uma mesma linguagem, que façam campanhas juntas, afinal a máxima “juntos somos mais fortes” é verdadeira. Porém, em um país continental, com dificuldades de acesso, no sentido amplo de transporte, educação e informação de maneira igualitária, o papel da SNNO não é fácil, na verdade precisa de uma força hercúlea para dar apenas alguns passos, ou melhor, para tentar apoiar e difundir o básico de informação médica oftalmológica, buscando acesso ao atendimento oftalmológico na maior extensão territorial possível.

Não podemos esquecer de agregar a nova geração de médicos oftalmologistas que todo ano ingressam no mercado de trabalho. Nossa área tem o privilegio de ter a tecnologia e a inovação ao lado, com equipamentos cada vez mais modernos e precisos para avaliação, diagnóstico e tratamento, entretanto isso tem um custo, que nem os colegas já estáveis nas suas clínicas conseguem sustentar sozinhos, muito menos os novos profissionais se não for feito um trabalho em equipe buscando otimizar o uso dos aparelhos, diminuir custos, manter alta qualidade de atendimento com incorporação das novas tecnologias e o mais importante talvez promover a troca de experiências e now know entre as gerações, buscando equilíbrio entre os jovens (mais rápidos, tecnológicos)  e a experiência e tradição dos que quebraram regras e trouxeram a oftalmologia ao patamar que esta hoje.

Trabalhar com glaucoma é viver sob “pressão”, não só a pressão intraocular, mas sim a pressão de trabalhar com uma doença incapacitante e grave que tem controle, mas que não é considerada como deveria, se fosse levada a sério como merece talvez o número de deficientes visuais fosse menor.

 

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