Por Camila Abranches
A gestão de um consultório oftalmológico exige muito mais do que conhecimento técnico. Para garantir a eficiência na rotina e oferecer uma boa experiência aos pacientes, é preciso estar atento à gestão do tempo, precificação, satisfação e atendimento. Esse guia visa oferecer dicas práticas e estratégicas para otimizar a administração do seu consultório, melhorar o desempenho e a satisfação da equipe, e garantir que os pacientes recebam o melhor atendimento possível.
Gestão do tempo: é possível otimizar sem perder qualidade?
Uma das principais preocupações dos médicos é otimizar o tempo de consulta, sem sacrificar a qualidade do atendimento. Estabelecer o tempo ideal para cada tipo de consulta pode aumentar a produtividade e a satisfação do paciente.
Na opinião da assessora de marketing da Sociedade Brasileira de Oftalmologia (SBO), da Sociedade Brasileira de Glaucoma (SBG) e editora da Revista SBAO – Gestão em Oftalmologia, Roberta Fernandes, a gestão é fundamental, pois impacta na eficiência operacional, na qualidade do atendimento ao paciente e na sustentabilidade financeira da prática médica. “Uma gestão eficaz não apenas otimiza processos administrativos, agendamentos e recursos, mas também contribui para a satisfação e fidelização dos pacientes. Ao assegurar uma gestão eficiente, o médico pode se concentrar mais na prestação de cuidados, garantindo uma abordagem sustentável para o crescimento contínuo da prática”, fala a especialista.
Consultas de rotina versus casos mais complexos: separe os tipos de consulta e defina o tempo necessário para cada uma.
Evite a superlotação de horários: deixe margem para atrasos e imprevistos. Importância da pontualidade: a pontualidade não só otimiza seu tempo, como também melhora a percepção do paciente sobre o atendimento. |
Precificação e rentabilidade: como definir honorários
Definir a precificação de seus serviços é uma das decisões mais importantes para a sustentabilidade financeira do consultório. Além de ser justa, a precificação deve refletir o valor do atendimento e os custos do consultório. É importante também programar a revisão de sua tabela de preços anualmente, levando em conta a inflação, custos adicionais e novas tecnologias que possam ter sido incorporadas ao consultório.
Pesquisa de mercado: avalie o que a concorrência está cobrando para definir um preço competitivo (mas não se baseie somente nisso).
Custos fixos e variáveis: certifique-se de que os custos operacionais estão sendo cobertos e que o valor cobrado reflete a qualidade do serviço prestado. Pacotes de serviços: oferecer pacotes pode ser uma forma interessante de agregar valor aos seus serviços e aumentar a rentabilidade. |
“A qualidade do atendimento não deve ser comprometida, mas deve haver investimento em práticas como um bom planejamento da agenda, segmentação dos tipos de atendimento e treinamento contínuo da equipe. Acreditamos que ferramentas de gestão integradas, ou que permitam a integração e rotinização, como sistemas ERP para saúde e automações com inteligência artificial ou chatbots para agendamento e confirmação de consultas, são recomendadas para melhorar a eficiência, pois abrem mão de um grande volume de trabalho manual operacional, permitindo que os profissionais se concentrem no que só eles podem fazer”, comenta Marcel Andrade fundador da Wellon, startup que visa conduzir hospitais, clínicas e operadoras de saúde a transformarem a experiência dos seus pacientes e clientes.
“Os principais desafios que enxergamos são as faltas e as tarefas administrativas repetitivas, que podem ser mitigados por meio da automação de processos, comunicação eficaz com os pacientes e otimização dos recursos do consultório, como a realocação dos horários vagos que surgem quando um paciente cancela seu agendamento, por exemplo”, conclui Andrade.
Combatendo o absenteísmo: impactos e soluções
O absenteísmo, tanto por parte do médico quanto dos pacientes, é um desafio constante para a gestão do consultório. Quando não controlado, ele pode afetar tanto a receita quanto a satisfação dos pacientes. Implementar uma política de cancelamento e reagendamento com pelo menos 24 horas de antecedência e utilizar tecnologia para lembrar os pacientes sobre as consultas pode ser uma saída.
Absenteísmo médico: estabelecer uma política de compensação e planejamento para emergências pode minimizar os impactos.
Absenteísmo de pacientes: é importante ter um sistema de lembretes eficaz, como mensagens automáticas ou confirmações por telefone, para reduzir faltas. |
Posso cobrar pela consulta em caso de ausência do paciente?
“Implementar lembretes de consulta e uma política de cancelamento com antecedência reduz faltas e melhora a organização. A cobrança por faltas pode ser uma solução, mas precisa ser bem comunicada para não impactar negativamente a experiência do paciente”, expõe Roberta.
A satisfação do paciente: chave para o sucesso
A experiência do paciente é um dos fatores determinantes para o sucesso de um consultório. Além de realizar um bom atendimento médico, criar um ambiente acolhedor e eficiente é essencial para a fidelização. Investir na qualidade do atendimento, desde o agendamento até o pós-consulta, é fundamental para garantir a satisfação.
Comunicação clara: explique os procedimentos e expectativas com transparência.
Atenção ao pós-consulta: mantenha o acompanhamento após a consulta para garantir a recuperação e resolver possíveis dúvidas. Feedback do paciente: incentive seus pacientes a fornecerem feedback sobre o atendimento, seja por meio de formulários online ou pesquisa pós-consulta. |
“Os principais fatores que impactam a satisfação do cliente em um consultório são a qualidade do atendimento, a pontualidade e a clareza na comunicação. Um atendimento humanizado, aliado à eficiência, é um grande diferencial competitivo, gerando confiança e fidelização, e isso começa no agendamento. A satisfação pode ser medida de forma prática por meio de pesquisas automatizadas enviadas logo após o atendimento ou alta médica, usando canais como o WhatsApp. Melhorar a experiência do cliente envolve facilitar o agendamento, enviar lembretes personalizados e garantir um pós-consulta proativo que demonstre cuidado. O feedback direto dos pacientes, coletado de forma simples e intuitiva, é fundamental para identificar pontos de melhoria e ajustar processos continuamente”, opina Andrade.
Comunicação não-verbal: você sabe qual é a percepção do seu paciente?
A leitura da comunicação não verbal do paciente permite que o profissional ajuste a abordagem durante a consulta, garantindo um atendimento mais humanizado e sensível. Sinais como desvio do olhar, inquietação ou braços cruzados podem indicar desconforto, insegurança ou desentendimento. Quando esses sinais são identificados, o profissional pode responder com empatia, por exemplo, desacelerando o ritmo da fala, fazendo perguntas abertas ou utilizando uma linguagem mais simples para facilitar a compreensão.
Segundo Êdela Nicoletti, psicóloga especialista em Terapia Comportamental Dialética (DBT) pela Behavioral Tech (Seattle-EUA) e em Terapia Cognitivo-Comportamental, a comunicação não verbal é fundamental nas consultas médicas, pois ela transcende as palavras e impacta diretamente a percepção do paciente. Gestos simples, como manter uma postura aberta, realizar contato visual e inclinar-se levemente para frente, demonstram interesse e disponibilidade, de acordo com a especialista. “Esses gestos, quando feitos com naturalidade, podem fazer o paciente se sentir mais confortável e acolhido”, relata.
O alinhamento entre a comunicação verbal e não verbal é crucial para criar uma experiência confiável e coerente. “Quando há congruência entre o que é dito e como o corpo se expressa, o paciente se sente mais seguro e confiante no atendimento. Situações de tensão, como ao comunicar um diagnóstico difícil, requerem ainda mais atenção a essa harmonia; qualquer desalinhamento entre palavras e gestos pode aumentar a ansiedade e insegurança do paciente”, reforça Vinícius Dornelles, mestre em psicologia na área de Cognição Humana.
Dentre as práticas úteis para aprimorar a linguagem corporal no atendimento estão a manutenção de uma postura aberta, o uso de gestos que demonstrem acolhimento e o contato visual moderado, conta Aslan Alves, psicólogo com pós-graduação em neuropsicologia. “No início da consulta, um simples sorriso e um aceno de cabeça podem ser poderosos para estabelecer uma conexão inicial de confiança. Para equipes de atendimento, como recepcionistas e assistentes, é recomendável um treinamento focado em linguagem corporal acolhedora, como manter uma postura ereta, um olhar acolhedor e gestos que demonstrem interesse, como um leve inclinar de cabeça. Técnicas como o role-playing, onde a equipe treina situações específicas, são especialmente úteis para desenvolver uma comunicação não verbal efetiva e acolhedora”, explica.
“Estudos sobre a Teoria da Comunicação, como os de Albert Mehrabian, indicam que, em situações de ambiguidade emocional, 93% da comunicação é determinada por fatores não verbais (55% pela expressão facial e 38% pelo tom de voz)”, detalha Alves. |
Confira algumas dicas da psicóloga e pedagoga Silvia Rezende, coordenadora técnica da Clínica de Psicologia LARES e professora do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP.
A importância da postura aberta: contato visual adequado e gestos acolhedores. Isso pode incluir exercícios práticos onde os participantes observam e ajustam sua própria linguagem corporal.
Role-playing: simulações de situações reais de atendimento ao paciente, onde os participantes podem praticar e receber feedback sobre sua comunicação não verbal. Isso ajuda a identificar áreas de melhoria e a desenvolver habilidades de empatia e acolhimento.
Escuta ativa: treinamento focado em técnicas de escuta ativa, como acenar com a cabeça, usar expressões faciais que demonstrem compreensão e fazer perguntas pertinentes. Isso ajuda a criar um ambiente onde o paciente se sente ouvido e valorizado.
Feedback contínuo: estabelecer um sistema de feedback contínuo onde os profissionais podem receber comentários sobre sua comunicação não verbal de colegas e supervisores. Isso promove um ambiente de aprendizado e melhoria constante.
Workshops de empatia: sessões que abordam a importância da empatia no atendimento ao paciente, incluindo exercícios que ajudam os profissionais a se colocarem no lugar do paciente e a entenderem suas necessidades e preocupações.
Mindfulness e autoconsciência: treinamentos que incentivam a prática de mindfulness para aumentar a autoconsciência e a regulação emocional. Isso ajuda os profissionais a manterem uma linguagem corporal positiva, mesmo em situações estressantes.
Melhores práticas de atendimento: como garantir um atendimento de excelência
Oferecer um atendimento de excelência é um compromisso que deve estar presente em todas as etapas da interação com o paciente. Desde o agendamento até o pós-consulta, o objetivo é proporcionar uma experiência fluída e sem frustrações. Lembre-se: o atendimento de qualidade começa com a recepção e vai até o momento do pós-consulta. Investir na experiência completa do paciente é o segredo para garantir a fidelização e uma boa reputação.
Tecnologia no atendimento: utilize sistemas de gestão que integrem agendamento, prontuário eletrônico e lembretes automáticos.
Treinamento da equipe: a equipe de recepção e apoio deve ser bem treinada para lidar com todos os aspectos do atendimento ao paciente, incluindo o acolhimento, a organização do fluxo de pacientes e a comunicação. Ambiente acolhedor: o consultório deve ser confortável e bem estruturado, criando uma atmosfera que passe confiança e segurança para os pacientes. |
Para o administrador de empresas e especialista em treinamentos, palestras e mentorias corporativos, Augusto Palácio Lyra, também conhecido como Tuba, é preciso encantar o cliente e isso está nos mínimos detalhes. “Sua funcionária tem uma grande possibilidade de melhorar a experiência do paciente. Ela está em contato com os clientes até por mais tempo que o profissional da saúde. Dê abertura para o que o time tem a dizer, isso também aumentará o comprometimento deles para com o negócio”, diz.
Ferramentas de mercado: como funcionam?
SurveyMonkey: é uma das ferramentas mais populares para a criação de pesquisas online, pois permite criar questionários personalizados para avaliar a satisfação do paciente de forma detalhada, com a capacidade de incluir perguntas abertas e fechadas.
- Vantagens: fácil de usar, oferece uma análise detalhada dos resultados, e é possível integrar com outras plataformas e ferramentas de CRM.
- Desvantagens: a versão gratuita tem limitações no número de respostas e recursos de análise.
Google Forms é uma plataforma gratuita e fácil de usar para criar formulários e pesquisas. Com ela, é possível criar questionários de satisfação personalizados e visualizar as respostas em tempo real no Google Sheets.
- Vantagens: gratuito, fácil de usar, e com integração simples ao Google Drive e outras ferramentas do Google.
- Desvantagens: não oferece tantas opções de personalização ou análise avançada como outras ferramentas pagas.
Qualtrics é uma plataforma robusta de pesquisa e experiência do cliente, amplamente utilizada em ambientes corporativos e de saúde para coletar e analisar dados sobre a satisfação dos pacientes.
- Vantagens: oferece uma ampla gama de recursos avançados para personalização, relatórios e análise de dados. Pode integrar-se com outros sistemas de gestão hospitalar ou CRM.
- Desvantagens: custo elevado, sendo mais indicada para instituições maiores.
PatientIQ é uma plataforma focada em coletar feedback dos pacientes de maneira contínua e integrada ao processo clínico. É especializada em pesquisas de satisfação e na análise da experiência do paciente, especialmente em ambientes de saúde.
- Vantagens: específica para o setor de saúde, com foco na experiência do paciente. Oferece análises detalhadas e integração com registros eletrônicos de saúde (EHR).
- Desvantagens: pode ser mais cara e requer integração com sistemas existentes no hospital ou clínica.
E o NPS?
O Net Promoter Score é uma métrica usada para medir a satisfação e lealdade dos pacientes (ou clientes) com base em uma pergunta simples: “Em uma escala de 0 a 10, o quanto você recomendaria nosso serviço para um amigo?” As respostas são divididas em três grupos:
- Promotores (nota 9-10): pacientes leais e satisfeitos, dispostos a recomendar.
- Passivos (nota 7-8): satisfeitos, mas não tão entusiastas.
- Detratores (nota 0-6): insatisfeitos, que podem compartilhar feedback negativo.
A pontuação do NPS é calculada subtraindo a porcentagem de detratores da porcentagem de promotores e o resultado varia de -100 a +100:
- Positivo: indica que há mais promotores do que detratores.
- Negativo: aponta que os detratores superam os promotores, sugerindo problemas na experiência do paciente.
Vantagens: fácil de aplicar e fornece um bom indicador de lealdade.
Desvantagens: não dá detalhes sobre o motivo da satisfação ou insatisfação, por isso é bom complementar com outras perguntas.
Outras dicas:
- Revise constantemente seus processos: sempre há espaço para melhorar.
- Tecnologia como aliada: invista em ferramentas de gestão que automatizam tarefas e facilitam a comunicação com os pacientes.
- Foco na experiência: um paciente satisfeito tende a voltar e a recomendar seus serviços a outros.