Por Flávia Lo Bello
Quando se trata de obter melhores resultados em medicina, a tecnologia é uma aliada bastante importante nesse quesito. No segmento da oftalmologia não é diferente, as tendências tecnológicas nesta área da medicina estão em constante crescimento e, frequentemente, surgem inovações no mercado, beneficiando médicos e pacientes. Recentemente, dois dispositivos foram criados em prol de estudantes de medicina. Os dois produtos, denominados REFRACTON e OnEYEs, são resultado de um projeto de inovação tecnológica e foram desenvolvidos em parceria entre a Universidade Potiguar (UnP) e a Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN).
O primeiro, REFRACTON, representa um simulador de erros refrativos e foi desenvolvido para promover melhorias no processo de ensino/aprendizagem nas escolas médicas, enquanto o segundo, OnEYEs, consiste em um dispositivo óptico vestível para auxiliar estudantes com deficiência visual parcial. Segundo o oftalmologista Francisco Irochima, Professor do Programa de Pós-graduação em Biotecnologia da UnP, Professor Adjunto do Serviço de Oftalmologia do HUOL-UFRN, Professor do Programa de Pós-graduação em Ciência, Tecnologia e Inovação da UFRN e Coordenador do Escritório de Negócios, Inovação e Tecnologia da Liga Norte Riograndense Contra o Câncer, a ideia do simulador surgiu devido ao ensino da refratometria sempre representar um desafio para a oftalmologia.
“Isso se explica pelo fato de se tratar de um exame que carrega certa habilidade específica a ser dominada, além da necessidade do conhecimento da física, matemática e geometria para a compreensão de como determinar e anular os chamados vícios refracionais (ametropias) do sistema óptico do olho humano”, afirma o especialista, ressaltando que o simulador é composto por uma torre emissora de lasers conectada por meio de uma barra a um globo ocular transparente dotado de um sistema de lentes ajustável que simula miopia, hipermetropia e astigmatismos. “O benefício principal consiste na visualização em tempo real dos diversos erros refracionais de forma tridimensional e interativa”, comenta, salientando que uma vez industrializável, o REFRACTON pode ser utilizado tanto no ensino médico, superior e em pós-graduações. “Não há dispositivos semelhantes no mercado para tal finalidade e seu depósito de pedido de patente já foi providenciado”, revela o médico.
Benefícios a estudantes com deficiência visual
Quanto ao desenvolvimento do dispositivo óptico vestível para auxiliar estudantes com deficiência visual parcial, o médico esclarece que este surgiu da necessidade de promover uma melhor acessibilidade de um dos alunos do curso de medicina que apresenta uma deficiência visual severa decorrente de uma distrofia de cones. “A partir daí, formamos uma equipe multidisciplinar com engenheiros e designers e criamos o protótipo do OnEYEs”, informa Irochima. Ele explica tratar-se de um conjunto de hardwares composto por um suporte de cabeça vestível para sustentar um smartphone e uma base para albergar um módulo transmissor de imagens em tempo real, além de um aplicativo para exibição em smartphones Android.
“A base é colocada sobre uma mesa e direcionada para a tela de exibição do PowerPoint do professor. A câmera capta a imagem e envia via Wi-Fi dedicado para o celular próximo ao rosto do aluno, tornando possível sua visualização”, continua o especialista, esclarecendo que o módulo transmissor é equipado com uma câmera e uma bateria capaz de prover uma autonomia de pelo menos 5h30min. A câmera é configurada de tal forma que, ao ser ligada, a transmissão das imagens é iniciada em tempo real por uma rede dedicada, que funciona mesmo onde não há sinal de Wi-Fi. “Dessa forma, os usuários do sistema poderão se conectar remotamente à rede sem fio do transmissor e receber as imagens da apresentação do professor em tempo real obtidas pela câmera na sala de aula ou durante as aulas práticas”, avalia.
De acordo com o oftalmologista, o aplicativo para exibição no smartphone tem como principal objetivo captar as imagens de interesse, processá-las e exibi-las na tela do celular, dispondo de sete filtros. Ele afirma que dois modos de utilização estarão disponíveis: um para captar as imagens a partir da câmera do celular e outro para receber as imagens disponibilizadas na rede local do módulo transmissor. “Para ambos, estará disponível um menu de seleção de sete filtros, os quais foram sugeridos pelo próprio aluno que inspirou o desenvolvimento do protótipo e são aplicados às imagens antes de serem exibidas, almejando aumentar a legibilidade de acordo com as necessidades do usuário de baixa visão”, destaca.
Além dessas funcionalidades, o médico comenta que se pretende incluir uma ferramenta de zoom, que também favorece as pessoas com baixa acuidade visual em aulas práticas em laboratórios, ambulatórios, enfermarias e até em estudos domiciliares. Para o professor, a exemplo do REFRACTON, o OnEYEs requer melhoramentos industriais e representa uma alternativa viável, prática e de baixo custo, que visa melhorar o processo de ensino/aprendizagem, a qualidade de vida e a inclusão de todo estudante com deficiência visual parcial. “Isso representa uma grande inovação, pois a maioria dos dispositivos disponíveis no mercado apresenta um elevado custo e, muitas vezes, estes dispositivos são inacessíveis para a grande maioria das pessoas”, finaliza Irochima.
REFRACTON
Utilizando softwares de modelagem e impressão 3D, o REFRACTON foi desenvolvido para auxiliar os oftalmologistas na difícil missão de ensinar a refratometria. “Toda sua fabricação, desde a produção das peças em plástico do tipo ABS plus e montagem dos componentes elétricos, como sistemas de circuitos impressos, foi realizada em ambiente universitário”, revela o oftalmologista Francisco Irochima, salientando que com o envolvimento dos alunos de iniciação científica da UnP e da UFRN, o REFRACTON passará por testes de validação em que dois grupos de estudantes do primeiro semestre do curso de medicina daquelas universidades serão submetidos às aulas expositivas convencionais e a uma simulação com o REFRACTON. “Ao final, os dois grupos passarão por avaliações quantitativas e qualitativas para se analisar o processo de ensino/aprendizagem”, observa o especialista.
OnEYEs
Ideia nascida de um problema real em sala de aula, o dispositivo óptico vestível para auxiliar indivíduos com deficiência visual parcial, ou simplesmente OnEYEs, também foi desenvolvido com impressão 3D e componentes com custos reduzidos. De acordo com o oftalmologista Francisco Irochima, o protótipo também passará por uma validação entre universitários da UnP e UFRN que apresentam deficiências visuais parciais triados pelos núcleos institucionais de suporte àqueles alunos. “Durante os testes individuais, um aluno que durante as aulas tinha que fotografar os “slides” com um tablet para só após ampliação poder estudar em casa, nos testemunhou: “Professor, foi a primeira vez que consegui acompanhar uma aula na faculdade!”, relembra o médico.
Fonte: Universo Visual