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Gustavo M. Hüning – MD, MBA, DiSSO. Especialista em retina, catarata e trauma. Tem interesse nas áreas de cirurgia 3D e metodologia lean aplicada à oftalmologia

Poucos sabem, mas 1º de setembro de 2015 marca uma das datas mais importantes para a Oftalmologia Brasileira. Naquele dia, em Florianópolis, ocorreu a formatura da primeira turma do Curso de Lideranças do CBO. Mas o que é esse curso? Atualmente chamado Curso de Desenvolvimento de Lideranças do Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), trata-se de um veículo que busca aperfeiçoar oftalmologistas que queiram ser atuantes nos mais diferentes âmbitos que a profissão possa envolver. Desde a criação de políticas de saúde pública ocular até a criação de ferramentas que auxiliem as necessidades dos demais colegas.

Para participar o candidato deve seguir as normas do edital sempre lançado na metade ano. A principal exigência é que haja a indicação por parte de uma sociedade estadual, de uma sociedade de subespecialidade, ou por algum membro do CDG (Conselho de Diretrizes e Gestão). Uma vez feitas as indicações, todos os candidatos são entrevistados por uma banca composta por diversos oftalmologistas. Então, os 14 melhores candidatos (considerando currículo e entrevista) são escolhidos para cumprirem um compromisso de 12 meses.

Antes de seguir, conto para vocês minha experiência e formação prévia. Desta forma ficam expostos o meu viés e os possíveis conflitos de interesse. Moro em Santa Maria/RS onde trabalho com foco em retina, catarata e trauma ocular. Além de atuar em clínica privada – tendo meu pai e dois irmãos como sócios – também atendo a parte cirúrgica de uma clínica de SUS no pequeno município gaúcho de Faxinal do Soturno. Durante a especialização em oftalmologia fiz MBA em Gestão Empresarial na Fundação Getúlio Vargas – FGV (2010-12), no Rio de Janeiro.

Posteriormente tive a honra de ser o primeiro associado médico do Instituto de Estudos Empresariais – IEE (2015-20), de Porto Alegre/RS. Considerado um dos maiores “think tanks” liberais do mundo, é reconhecido por ser um espaço totalmente aberto ao debate de ideias buscando, assim, formar líderes que sejam catalizadores de melhora da sociedade civil. Também, antes do CBO Lideranças, cursei o Programa de Liderança Cirúrgica da Harvard Medical School, em Londres/Reino Unido e Boston/EUA (2018-19). Repleto de cirurgiões de todo planeta, lá aprendi que liderança é uma ciência com métricas e em constante evolução. Por último, não poderia deixar de citar minha passagem, entre os 13 e 17 anos de idade, pelo Interact Club de serviços voluntários filiado ao Rotary Internacional que investe na formação de jovens lideranças comunitárias.

Tendo este retrospecto, confesso que, ao ser indicado pela Associação Brasileira de Catarata e Cirurgia Refrativa – ABCCR/BRASCRS, entrei no Curso de Lideranças do CBO com um propósito diferente. Meu objetivo era quebrar um repetido preconceito que eu carregava, assim como muitos colegas: “O CBO só serve pra cobrar anuidade!” Apresentei meu sentimento de desamparo durante a entrevista e aprendi, mais uma vez, que honestidade e sinceridade valem a pena. Ao longo do curso este tópico foi discutido diversas vezes. Com dedicação, brilhantismo e irreverência o presidente do CBO, Dr. Cristiano Caixeta Umbelino, a coordenadora da nossa turma, Dra. Luciana Negrão de Almeida Morais, e outros tantos conseguiram trazer a tona os pontos que são mais caros para nós oftalmologistas.

No decorrer de um ano tive a oportunidade de ter minha opinião confrontada não com outras opiniões, mas sim com dados – que demonstraram que meu pensamento estava equivocado. Mas não foi só isso que me fez dar grande valor ao curso de lideranças. Devido à proximidade das notas da seleção e à grande qualidade dos candidatos, nossa turma foi conformada com 18 alunos. Sorte a minha que, inesperadamente, tive outros 17 professores de primeiríssima linha durante 12 meses.

Historicamente a oftalmologia é a grande vanguardista entre as especialidades médicas. Portanto, era de se esperar que os colegas fossem pessoas de destaque, mas também levava a crer que seria bastante difícil encontrar consonância num meio heterogêneo; lembrem que estamos falando de representantes de metade dos estados do Brasil. Diferenças de contexto, realidade, pensamento, sotaque, subespecialidade, opinião, expressão, etc. Entretanto, essa variedade de elementos criou a tempestade perfeita. A troca franca de ideias, muitas vezes antagônicas, sempre foi respeitosa e conseguiu fazer com que os interlocutores conseguissem se colocar no lugar da contraparte provocando crescimento para todos os envolvidos. Não à toa repito que tive colegas geniais, aprendi infinitamente mais do que contribuí.

Essa genialidade contribui para que a série de palestras, trabalhos em grupo, discussões de livros e criação do trabalho de conclusão fossem mais proveitosos. O gostinho de quero mais ao final de cada reunião na sede do CBO serviu de impulso para que o um ano de curso passasse voando. E isso pode ser percebido no encontro final, durante o Congresso do CBO 2022 em Curitiba/PR.

No último encontro os alunos devem apresentar um trabalho de conclusão que tenha impacto na Oftalmologia Brasileira. E é neste dia que se pode corroborar cada um dos elogios feitos aos professores e alunos da 8ª turma. Ali se viu que a criatividade e a vontade são os únicos obstáculos para os humanos que desejam ajudar e melhorar a vida dos outros. Os projetos apresentados abordavam desde campanhas de atendimento no interior da Amazônia com barco abençoado pelo Papa Francisco, passando por ferramentas hi-tech para melhorar a avaliação dos residentes, os instrumentos que auxiliem nas publicações científicas, até projetos de gerenciamento lean para otimizar o atendimento nos grandes serviços do país.

Infelizmente é impossível abordar todos aqui, especialmente se citarmos o alto nível. Mas essa pequena amostra já dá uma ideia de que o curso consegue ao longo do tempo citado nos tornar melhores. E esta afirmação é mensurável e unânime entre os formandos – perdão Nelson Rodrigues. Se houver algo que eu possa sugerir aos jovens oftalmologistas que leem esses parágrafos, eu diria: Faça o CBO Lideranças, ele vai mudar a sua vida!

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