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O Podcast RX – Por dentro da sua próxima receita médica!, do dia 3 de março de 2022, teve como convidado o empreendedor digital Pedro Dias, que fundou a empresa Nexodata com o objetivo de antecipar o futuro na área da saúde e está fazendo isso por meio da receita digital, que permite uma melhor experiência para o profissional de saúde e para o paciente no ato da prescrição.  

Conforme ele explica nesta entrevista publicada abaixo, a receita digital possibilita a entrega de um serviço mais ágil e com maior flexibilidade sem necessidade de preocupação com segunda via por perda ou danificação do papel e até mesmo permitindo que o paciente compre o medicamento sem ter que ir fisicamente até à farmácia. “Pedro também comenta que, utilizando caminhos digitais, o processo é mais seguro, pois o software possui informações estruturadas, como interações medicamentosas, cruzamento de peso e altura para cálculo da dose etc., ajudando o profissional de saúde com um leque de dados disponíveis , ressalta o oftalmologista Paulo Schor.

 

Paulo Schor: Hoje eu vou conversar com um jovem brilhante, que é o Pedro Dias. Por acaso, o Pedro é filho do meu melhor amigo de infância, o Fábio Dias, uma pessoa que eu sempre falei que era a mais inteligente que eu conhecia. E o Pedro herdou do Fábio muitos genes dessa inteligência, persistência e simpatia. A conversa aqui vai girar muito em torno do empreendimento que o Pedro já tocando, que ele fundou, que se chama Nexodata. Mas antes disso, eu acho que vale a pena a gente conversar um pouco sobre quem é o Pedro Dias, que eu considero um exemplo importante de juventude, que não necessariamente caminha pelas vias que foram pré-determinadas.  

O que me interessa muito, e acredito que interessa também para quem está ouvindo a gente, é que o Pedro, após o colégio, foi para o Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa), mas não acabou a faculdade, porque logo foi atrás de fazer um empreendimento enorme que ele vai contar um pouco para nós, que é a Vitta, uma plataforma de prontuário médico de sucesso muito grande no mundo empresarial, que foi comprada pela Stone. Mas ele não parou por , fundou uma outra empresa, que a Nexodata. Pedro, muito obrigado por você ter aceitado o nosso convite, para mim é uma honra conversar com você e rechear um pouco de juventude e de temporalidade nessa história da próxima receita médica. 

 Pedro Dias: eu que agradeço o convite, Paulo. Obrigado pela introdução, se eu for 10% de tudo o que você comentou, eu fico muito feliz. Concordo com a sua leitura em relação ao meu pai, acredito que tenho algumas das características dele, mas eu diria que a inteligência estou muito longe ainda, distante da capacidade dele, mas a persistência, o trabalho duro, os princípios, são realmente muito parecidos. Estar aqui conversando com você é também um pouco de dever, no bom sentido, porque eu lembro que quando eu tinha 18 anos e estávamos começando a Vitta, eu estava no segundo semestre da faculdade e nem sabíamos direito o que a queríamos fazer com a empresa, meu pai falou que eu deveria conversar com você, porque vocês eram amigos de infância. 

E daí eu contei brevemente para você por telefone qual era a nossa ideia e você recebeu, eu, o João, os meus sócios na época, de portas abertas dentro da UNIFESP, no laboratório de inovação, separou um time para escutar o que a gente tinha para falar. Dessa forma, tudo que eu puder fazer e que estiver ao meu alcance é um sentimento de dever, porque quando não tínhamos absolutamente nada, quando estávamos começando, você estendeu a mão para nós e nos ajudou. Nunca vou me esquecer disso e guardo um carinho muito grande por você, não só por ser meu médico também, porque não é fácil ter dez graus de miopia, e eu sei que meus olhos estão em boas mãos. Mas como empreendedor, será sempre um dever para mim estar aqui ajudando e podendo contribuir. 

  

Schor: Muito legal, Pedro, é um prazer cuidar de você também. Queria que você começasse contando um pouco o que é a Vitta e onde ela hoje está inserida nesse universo dos prontuários eletrônicos. A gente tem uma relação de amor e ódio, sendo médico, com prontuário eletrônico, porque cada vez que vamos para um hospital ou para uma clínica diferente, tem um outro prontuário, e a gente fica muito bravo, porque os botões estão em lugares diferentes, faltam botões, sobram botões, e a gente sempre fica com ideia de que o prontuário foi escrito por alguém que não era da área. 

Então, isso que você falou sobre o time que eu montei, era de gente da área, que conseguia desenhar os prontuários. Mas o prontuário Vitta teve uma história interessante, ele vem muito na pegada do médico codesenhando esse prontuário, fazendo parte do processo de desenvolvimento dele. Você acha que essa foi uma das virtudes do prontuário da Vitta? Como foi a ideia de criar a Vitta e do sucesso dela? 

 Dias: Então, Paulo, a nossa ideia de ter começado a empreender com a Vitta através de prontuário eletrônico teve início em 2014 para 2015; foi uma ideia do João e do Lucas, os meus dois sócios e, naquele momento, o problema que tínhamos identificado era a falta dentro dos consultórios médicos principalmente quando se fala de atenção primária, que não são os hospitais, as operadoras, a alta complexidade, estamos falando da clínica, do consultório, dos especialistas de uma maior organização, de um software igual ao que vemos no mercado financeiro e em outros setores. E dentro do consultório médico, sentíamos falta de ter uma ferramenta à altura da atividade e que conseguisse ajudar o profissional de saúde, o médico, a atender melhor, a cuidar melhor da sua clínica, do seu negócio.  

E, então, identificamos esse problema e foi assim que começamos, basicamente acreditando que se colocássemos nossa energia, se nos alinhássemos aos profissionais de saúde, conseguiríamos construir uma solução para isso, algo que ajudaria no dia a dia do consultório médico, principalmente da atenção primária. E aí fomos atrás desse sonho. Eu acho que o que fez com que fôssemos bemsucedidos na Vitta, do ponto de vista de agregar valor para o profissional de saúde, foi sermos extremamente curiosos, dedicados e entender quais eram as dificuldades, a infelicidade dos profissionais de saúde em relação aos softwares dos sistemas que eles já utilizavam no dia a dia do consultório.  

E é uma tarefa ingrata, difícil de realizar, porque como existem muitas especialidades médicas, e sempre existiram vários softwares para a área médica na atenção primária, se contarmos as dezenas de soluções que existem e nenhuma delas vencedora, que conseguiu de fato despertar esse carinho por parte dos profissionais de saúde, dos médicos, era difícil entrar em um consultório e conseguir entender e depois desenhar uma solução que atendesse todo mundo, porque são muitas especialidades, muitas especificidades de cada profissional, e é muito difícil conseguir endereçar todas elas. Eu nem culpo as empresas de software, porque é algo complexo mesmo de ser feito. Mesmo quando a gente vai para um ambiente mais hospitalar, que possui plataformas muito grandes, como a Philips e MV, que têm milhares de funcionários, é super desafiador. 

Mas acredito que o que fez muita diferença para nós foi ter muito claro que o nosso objetivo era atender melhor o dia a dia do médico dentro do consultório, com uma solução de gestão e prontuário clínico, prontuário eletrônico do paciente, feito junto com o médico. Porque só assim conseguiríamos construir uma solução que atendesse todos aqueles problemas que os profissionais de diferentes especialidades tinham. Dessa forma, fundamos a empresa em 2014 para 2015, e em meados de 2016 fizemos uma fusão com uma outra empresa do setor que você bem conhece, porque ela começou dentro da UNIFESP em 1998, se não me engano. Essa empresa detinha uma solução chamada ClinicWeb, que já era utilizada por mais de dez mil médicos ao redor do Brasil.  

E nós ainda estávamos começando a nossa carreira como empreendedores em saúde, então, enquanto tínhamos dois anos praticamente de vida da empresa, a Katu, que era a dona proprietária da ClinicWeb, desse software, tinha quase 20 anos de estrada e era uma empresa que foi concebida por empreendedores de uma área técnica. Eles saíram, se eu não me engano, do Laboratório de Informática Biomédica da UNIFESP, que é uma super universidade, e construíram essa solução ali. E entendemos que eles eram muito melhores do que nós nesse ramo. Nós tínhamos uma vontade muito grande, uma visão de negócio muito interessante, acesso à capital e uma boa cultura e entendíamos que aquela empresa, a Katu, na época era a empresa vencedora do ponto de vista de produtos, de solução, de entendimento das dores do mercado.  

E quando a gente encontra alguém melhor, que tem alinhamento de cultura como empreendedor, faz todo o sentido unir forças. Sendo assim, conseguimos desenhar uma fusão em 2016, que foi super bemsucedida, e foi o momento em que saímos da faculdade, porque aumentou muito o grau de responsabilidade como empresários. A partir desse momento, assumimos a solução que veio da Katu, que era a ClinicWeb, como a nossa principal ferramenta de gestão para clínicas e consultórios médicos, e demos autonomia para o time que veio dela para continuar na condução do desenvolvimento dessa solução a longo prazo. E sempre o cliente é a razão, não é que ele tenha razão, ele é a razão, essa é uma frase que eu pego emprestado da Stone, não é minha, e a gente sempre tentou se colocar ao lado do profissional de saúde, do médico especialista, desde o começo, e continuamos assim.  

Hoje eu não estou mais no dia a dia da Vitta, nós vendemos a empresa em 2020 para a Stone, portanto não sei muito bem atualmente como está sendo conduzido o processo de evolução do prontuário eletrônico da nossa solução. Mas naquele momento, a nossa visão de negócio, de produto, era dar responsabilidade para o pessoal da Katu, que veio e sabia fazer isso muito melhor do que nós, ficar lado a lado com o nosso cliente, que era o profissional de saúde, e desenvolver a solução em conjunto. E tem uma coisa que eu acho importante ponderar, por fim, que é quando começamos em 2015; eu fico imaginando a Katu no início dos anos 2000 se propondo a fazer isso, então, em 2015, quando a gente começou, o mercado não estava preparado para prontuário eletrônico. Na verdade, o mercado estava preparado sim, mas ainda tinha uma barreira cultural muito grande, tinha essa má vontade por parte da classe médica em usar, e com toda razão do mundo, porque era um desafio muito grande 

E eu fico feliz porque sete anos depois, hoje isso não tem mais. É muito raro entrarmos em um consultório que tem um atendimento 100% no papel, isso já virou uma exceção. E fico muito feliz porque quando começamos, em 2015, encontrávamos muito isso e eu acredito que essa barreira foi vencida, não só pela Vitta, pelo ótimo trabalho, mas por outras soluções que também foram desenvolvidas em paralelo por outros empreendedores.  

  

Schor: E você contando essa história faz todo o sentido, exatamente por não reinventar uma roda melhor do que a roda que temos. Vocês eram, com certeza o melhor time de business, de marketing, de estratégia, de energia. Mas vocês eram e ainda são, agora isoladamente, um time de altíssima performance no negócio. E já pulando para a Nexodata, Pedro, o que te deu na cabeça de sair de uma empresa que hoje deve valer muitos milhões, quer dizer, você não saiu, provavelmente tem uma participação na empresa que você ajudou a fundar, mas você foi para uma outra empresa que tinha, aí sim, uma tese que é bastante ousada e que vai muito em direção ao negócio propriamente dito e ao fluxo de informações. Como aconteceu isso? Qual é a história por trás disso? 

 Dias: Olha, a última ponderação que eu faço em relação à primeira pergunta, uma coisa curiosa que você mesmo comentou e que é muito importante em saúde, é ter um mix, um casamento saudável entre os especialistas e pessoas mais técnicas, porque não é à toa que demora para se formar como um médico especialista e pessoas de negócios também. Eu vi muitas empresas extremamente acadêmicas não decolarem porque não conseguiam ter a visão de negócio, que é super importante. Se quisermos ser bemsucedidos, precisamos atrair recursos, precisamos fazer um negócio ser rentável, conseguir atrair talentos, reter esses talentos, desenvolver a solução, então é preciso ser bemsucedido como um negócio também. Não basta ter o conceito técnico na cabeça, também tem que saber se posicionar como uma empresa e fazer essa empresa ter sucesso. Mas, ao mesmo tempo, não adianta olhar o mercado com um certo preconceito e falar tudo o que tem aí não funciona, tudo o que tem aí é dinossauro, é antiquado e eu vou ser o cara de negócios que vai mudar esse setor”. Não é assim que funciona. O setor de saúde é específico, regulamentado, técnico, por isso é preciso achar um meio termo entre os dois, senão a gente não vai conseguir atravessar para o outro lado. Acho que esse casamento é muito importante.  

Agora, falando um pouco da Nexodata, sobre o processo de transição da Vitta para a Nexodata e como tivemos a ideia e resolvemos empreender na época com essa parte da receita digital, de medicamentos, exames etc., foi logo após termos feito a aquisição da Katu junto à empresa. Eu sou muito curioso e sempre me dediquei a perguntar bastante, a me aprofundar em relação a qualquer tema, e logo após esse movimento estratégico que fizemos junto à Katu, eu me interessei bastante pelo tema da prescrição médica, uma coisa que me chamou bastante atenção. Na época, tinha uma empresa já no Brasil que trabalhava com isso e já existia o hábito de pelo menos uma vez por ano ir para os Estados Unidos visitar algumas empresas. Estados Unidos e Brasil têm algumas diferenças, principalmente em relação ao setor de saúde, mas, ao mesmo tempo, existem coisas que já funcionaram lá e que são tendências as quais, muito provavelmente, irão se replicar por aqui.  

A telemedicina, por exemplo, já era algo que funcionava nos Estados Unidos há um bom tempo e foi realmente ganhar atenção aqui durante a pandemia. Dessa maneira, a tecnologia esa serviço de melhor atender o cliente final, qualquer que seja ele, um médico, um hospital, uma instituição ou paciente. Tecnologia existe para melhorar o nível de serviço que você presta para o consumidor final. Portanto, quando vemos empresas de tecnologia e excluímos variáveis regulatórias, culturais, conseguimos entender mais ou menos como isso deveria se desdobrar no Brasil. Em 2016, fizemos uma visita aos EUA e eu fiquei encantado com o modelo de receita digital. E naquela época, não lembro exatamente qual a proporção de americanos que já recebiam uma receita digital em vez de uma receita impressa, mas já era algo, por exemplo, mais do que 80% da população.  

No Brasil era o oposto, 99,9% das receitas eram feitas no papel com carimbo e eu refleti e pensei que isso era um pouco o negócio do empreendedor, é meio que natural, não é possível esse negócio ficar assim no Brasil, ficar prescrevendo receita no papel. Hoje, 2022, brincamos aqui dentro da empresa que depois do PIX, do QR Code, do pagamento instantâneo, é como se vivêssemos na época do talão de cheque, porque estamos usando o PIX, e a receita digital tem um QR Code, portanto é uma transação imediata e não tem mais o papel. Sendo assim, o ponto de partida para a fundação da Nexodata foi termos conhecido o modelo de fora, e aí, como empresários, a gente olha para o setor de saúde, farmacêutico, que é muito grande, e tem o que a gente chama de Total Addressable Market (TAM). 

Então era um mercado muito grande, que é o mercado de medicamentos, e se não me engano, o Brasil é o sexto maior mercado do mundo, um mercado que cresce e ainda está totalmente no papel. Portanto, a chamada para nós foi por que não começamos a tentar resolver esse problema da receita impressa, que é papel, caneta e carimbo, e transformar esse fluxo em um fluxo 100% eletrônico? Se conseguirmos ser bemsucedidos fazendo isso, estaremos dentro de um mercado muito grande e teremos uma função social. O que eu chamo de função social? O que o serviço devolve de valor agregado para quem o utiliza.  

O serviço que prestamos hoje na Nexodata, como uma plataforma vencedora de receita digital, é permitir que o brasileiro, em qualquer canto do país, no SUS ou no setor privado, em vez de sair da consulta com um pedaço de papel feito à caneta e com carimbo, que é difícil às vezes de ler ou que ele pode perder, que amassa, e tem toda a história da segunda via, que seja possível substituir isso por um link que o consumidor recebe por WhatsApp, clica e abre uma receita digital com o QR Code, com todas as informações dos medicamentos legíveis, armazenáveis, e que ele consegue acessar essa informação depois, e não corre o risco de perder e pode comprar sem necessariamente ter que ir doente até uma farmácia física, é uma experiência totalmente digital.  

Da mesma forma como nós compramos hoje por esses aplicativos a nossa comida e outros serviços, por que não pode ser assim também com medicamentos? É óbvio que esse serviço tem as suas complexidades, é um setor regulado, temos que ter regulamentação, isso é fundamental, mas não pode ser impeditivo para se entregar um serviço melhor. Lá atrás, a ideia era ter contato com um negócio muito bacana e que vimos funcionando, e acreditamos que isso ia acontecer em algum momento no Brasil. Certamente que a gente não esperava que uma pandemia ia aparecer para acelerar esse processo. E a visão do consumidor final é como substituir esse processo que, na nossa visão, não é o melhor, para criar uma experiência digital muito melhor. E foi isso que veio nos guiando ao longo dos últimos anos. 

  

Schor: Perfeito, eu uso o tempo todo a receita digital e, além de tudo isso, ainda tem o fato do paciente não precisa mais vir no consultório caso ele perca a receita e o médico precisar dar outra, então tem também esse benefício. Acredito que esse benefício direto para o paciente é muito claro, cada vez é mais fácil fazer as prescrições digitais a distância. As coisas ficaram muito mais fáceis e a integração com alguns prontuários eletrônicos de pacientes, que é um pouco da área que vocês também entraram, ajuda mais ainda. Tendo o nome do paciente e sabendo o que ele estava tomando, isso ajuda para o lado do médico. Mas queria saber um pouco do futuro, Pedro. Você fala que a Nexodata antecipa o futuro do sistema de saúde e eu acho que é exatamente o que você fala do PIX 

Você traz conceitos que vem aí de empreendedorismo, de negócios, para uma área que é muito tradicional, e eu não acho que é só pela regulação, mas pela cultura e pela comodidade, pela zona de conforto. Mas a minha pergunta é: o que você vai fazer com esse monte de dados? Não é à toa que se chama Nexodata e não Nexoreceita, e claro que nós vamos fazer a receita, porque ela é um meio de termos acesso também a dados do paciente, de consumo, de medicamento. Você conseguiria fazer um monitoramento de uso real tanto de tipos de prescrição como de doenças, se estão aumentando a prevalência ou diminuindo? Como é o pensamento de vocês em relação ao uso desses dados para a melhoria da saúde do sistema como um todo? Vocês têm ido um pouco para esse lado? 

Dias: Essa é uma excelente pergunta. Eu acho, de verdade, que o nome não tem muito a ver. Nós pensamos esse nome não lembro nem por quê e não teve essa intenção, honestamente, mas é um tema importante. Quando a receita é feita no papel, um dos grandes problemas, e tem pessoas que estudam isso do ponto de vista de saúde populacional, é que ela oferece alguns riscos, porque não tem uma coisa fundamental para ter um cuidado mais preciso, que é uma ferramenta que chamamos de Clinical decision support, que é durante o ato do atendimento médico e da elaboração, a escolha do tratamento e sua prescrição, temos como aliar a tecnologia a artigos científicos, informações estruturadas, para que o médico consiga fazer uma prescrição mais segura, na qual ele possa ter acesso a interações medicamentosas, interações entre medicamentos e alimentos, cruzar informações de peso e altura do paciente para acertar a posologia adequada etc 

Isso tudo são dados estruturados e já existe muita literatura a respeito disso e ótimas soluções de mercado que organizam essas informações para que uma empresa de tecnologia consiga disponibilizar isso para o profissional de saúde em tempo real, durante o ato da prescrição do tratamento, para que ele consiga ter um custo para o paciente melhor, daí ele aumenta a qualidade do cuidado, evita erros, diminui custo e, consequentemente, promove um tratamento melhor. O primeiro passo da receita digital, olhando para o futuro, inclusive, é ter um processo mais seguro, mais qualidade no atendimento só pelo fato de tirar isso do papel e usar mais tecnologia. E nem é uma inteligência artificial de outro mundo, é basicamente usar informação estruturada no momento certo, é simples de fazer e já acontece.  

Nós já fazemos isso para todos os nossos clientes. São quase 300 hospitais que têm acesso a esse tipo de tecnologia de ponta. Aí o que acontece também é que hoje temos muito pouca informação relacionada ao cuidado da porta para fora do hospital ou de uma clínica, porque esse tratamento sempre foi prescrito no papel e o profissional não tem muito como conseguir trabalhar com essas informações, porque não é uma informação estruturada, então estamos muito dedicados em crescer ainda mais. A penetração da prescrição digital no Brasil não passa de 5%, tem um volume muito grande de prescrições que ainda estão em papel e que temos que fazer aquele trabalho básico, de informatizar o processo dentro da instituição, da empresa de tecnologia, ajudar o médico e treiná-lo para que ele passe a se adequar a esse novo processo, para depois conseguir entrar em outras derivadas.  

Dessa forma, acredito que a missão ainda é muito grande para dar escala a esse tipo de serviço e para a população brasileira. Setenta por cento da população ainda é atendida pelo SUS e funciona bem. Então, ainda estamos em um nível mais básico e temos que trabalhar isso melhor, mas a longo prazo, sem dúvida, quando temos o processo inteiro informatizado, o nível de acesso a informações estruturadas é muito maior e isso dá muito mais possibilidade para que as entidades do setor consigam trabalhar essa informação própaciente, prósetor de saúde. Ainda mais vendo tudo o que conseguimos evoluir nos últimos anos com a lei geral de proteção de dados, acredito que temos um setor muito mais organizado do ponto de vista de como tratamos a informação. A nossa visão em relação a isso, Paulo, é que a Nexodata não usará isso para ela, porque o nosso trabalho é entregar a melhor experiência possível no ato da prescrição para o profissional de saúde, para a instituição de saúde, e para o paciente a melhor experiência possível digital. Essa é a nossa missão.  

A parte de inteligência e dados eu acho que é uma consequência de poder escalar a receita digital para o Brasil. E eu acredito que esse trabalho tem que ser desempenhado pelos hospitais, pelas operadoras, pelo próprio Ministério da Saúde e pelos hospitais municipais, pelo SUS como um todo e por todas essas entidades. Nós estamos ali a serviço dessas empresas e o que pudermos fazer para agregar e ajudar, vamos fazer. Não é a nossa missão principal, é uma consequência de ter um setor 100% digitalizado, e é uma consequência maravilhosa, porque aí conseguimos dar isso na mão das pessoas, que são os especialistas. Daí o processo fica muito mais inteligente, você cria essa estrutura, essa informação e a coloca a serviço do setor na mão das pessoas corretas, das empresas, das instituições, dos hospitais.  

Isso é muito positivo para o setor e para o paciente, portanto acredito que será uma consequência positiva. Mas é preciso tomar muito cuidado com privacidade e proteção de dados, o setor de saúde é muito visado, dessa maneira, a gente tem que sempre tentar subir a barra de segurança da informação o máximo possível e eu vejo o setor preocupado com isso, o que é excelente. As empresas estão preocupadas com isso, o nível de tecnologia é bom, mas nós, especificamente, iremos, talvez, delegar para quem é especialista, para quem é bom e faz isso melhor do que a gente. Mas o que pudermos fazer para ajudar, nós vamos estar na mesa discutindo, ajudando. 

  

Schor: Já meio que indo para o fim da nossa conversa, tem sempre aquela história de mas vai fazer prescrição digital? Precisa de um celular de altíssimo poder de processamento? Nem todo mundo vai ter acesso, como é que vamos levar isso para a saúde pública? Como é que vai levar para o SUS?” E você falou várias vezes de assistência básica, de SUS, e eu sei que você está mirando nesse mercado de um jeito bem importante. Você não quer falar um pouco, talvez, de alguma experiência anedótica, de quem achava que não ia dar conta de abrir receita digital e conseguiu abrir? Ou como é que vocês estão lidando com esse tipo de comentário, de que isso é só para a classe A? Como é a penetração disso? Eu sei que é muito mais simples, mas acaba de vez em quando tendo essa fachada de uma coisa muito complexa e que, portanto, será difícil as pessoas usarem. 

Dias: Eu escutava muito essa pergunta no começo da Nexodata e também quando estávamos propondo o prontuário eletrônico na Vitta, e depois, quando propusemos a receita digital, eu também escutei esse tipo de questionamento. Eu procurei aqui um material que eu lembro que vi uma informação no Brasil, que nós temos 71% das pessoas com acesso à internet. Essa é a penetração. Eu não sei qual é a fonte disso, mas eu confio nessa informação e acho que são 150 milhões de usuários; pelo menos 110 milhões de brasileiros com smartphone, e acredito que o Brasil é o segundo maior mercado em termos de usuários do Facebook, Instagram, WhatsApp etc. Então, resumindo, o brasileiro está informatizado, ele tem acesso à internet, via de regra ele tem um smartphone, por mais simples que seja, ele tem as configurações mínimas para que tenha acesso à internet e os planos de acesso são cada vez mais acessíveis também.  

A gente percebe muitas pessoas vendo Netflix no caminho do trabalho, então, é mais complicado imaginar alguém vendo uma série a caminho do trabalho do que alguém que recebeu um negócio que precisa comprar porque é para a saúde dele, que é só um documentozinho”, por isso não acredito mais nisso, acho que o setor já está preparado. Acredito que é muito mais um desafio cultural do que tecnológico, porque o desafio tecnológico, na verdade, não é o paciente comprar o remédio, é do hospital e do profissional se adequarem ao processo de passar para a receita digital. Não é simples para um hospital ter o certificado digital, fazer a integração com o software de prescrição eletrônica, preparar o corpo clínico e começar a usar. Portanto, aqui temos um desafio maior, porque não é simples, é mais complicado.  

Agora, uma vez que essa receita é emitida de forma digital e hoje já emitimos milhões de prescrições digitais por ano, que são para milhões de brasileiros em todos os Estados do país é muito simples, porque o paciente recebe isso por WhatsApp, e todo brasileiro usa o WhatsApp ou uma mensagem de texto (SMS), então é possível consultar a partir desse link, não precisa fazer download de nenhum aplicativo, a pessoa consegue acessar no seu navegador e em questão de segundos já está vendo ali a sua receita, dessa forma  não tem porque não funcionar. Tanto que durante a pandemia isso ganhou uma escala muito representativa e isso não tem volta, porque quem já experimentou, tanto o médico quanto o paciente, gosta. Do lado do consumidor, eu fico super tranquilo, porque todo mundo já possui acesso ao telefone ou internet e são coisas simples, básicas. Eu acredito que a dificuldade está mais do lado da origem, da geração da receita.  

Eu tenho uma história boa para contar. Eu estava na casa da minha exnamorada e estávamos jantando, era na pandemia de 2021 e a minha exsogra me chamou e falou olha, o Davi fez uma receita digital, foi a primeira que eu recebi na minha vida”; eu falei nossa, que legal”, e era da Nexodata e eu pensei caramba, é uma receita nossa”, então foi muito louco, porque foi dentro de um ambiente conhecido. E eu entendi que o que nós fazíamos era muito maior do que nós como indivíduos, porque foi uma coisa muito natural, que nem você recebe um SMS às vezes do banco falando que a sua fatura está fechada e você tem que pagar dali a dez dias. Ela recebeu uma receita naturalmente, e essa receita foi feita por nossa empresa e eu nem sabia disso. Portanto, é real, o que a gente faz é verdade, está acontecendo, e vai ser cada vez mais comum e menos estranho para a gente receber uma receita digital. Eu tenho muita confiança e segurança nisso. 

  

Schor: Ótimo. E para os médicos, eu acho que o que você falou é fundamental. Você só agrega funcionalidade que não agregaria de outro modo, você consegue colocar a informação, que é uma informação sensível que você precisa, além de outras, e eu gosto muito da possibilidade de você poder codesenhar com o paciente, o que que ele vai tomar, se vai ser genérico, se vai ser alguma coisa de marca e, de repente, até quanto que ele vai pagar, aonde que ele vai comprar. Isso tudo se consegue trazer de um jeito muito mais moderno com essas conexões todas que vocês estão fazendo, e acaba sendo algo que fica bom para todo mundo. Pedro, obrigado, não vou mais tomar teu tempo, eu sei que vocês estão com um baita sucesso, vocês um milhão de pacientes ativos, 20 mil farmácias, então o sucesso já bateu na porta de vocês há muito tempo.  

Acredito que agora é ampliar mesmo um pouco da escala, tornar cada vez maior. Eu torço muito para que isso chegue ao SUS, para que a gente consiga ter uma organização, uma informatização, uma digitalização efetiva pelo número de pacientes e pela característica que temos do SUS. E quando isso tomar uma escala maior, é o que você falou. Eu aposto muito em políticas públicas de saúde baseadas em dados e, principalmente, no dado da vida real, e o exemplo que você deu é fantástico, casa exatamente com isso, quando você vai dar uma olhada no que aconteceu com aquele remédio que foi aprovado durante uma pesquisa clínica para um grupo restrito de pacientes no mundo todo, é completamente diferente. O dado é outro, assim, na vida real é que a coisa se revela e os números de vocês mostram isso, e a experiência mostra isso também. Com certeza a Nexodata é uma empresa real, da vida real e para gente real. Muito obrigado, Pedro. 

 Dias: Obrigado você, Paulo, pelo convite. Eu fico muito feliz de poder estar conversando com você. Você recebeu convidados ilustres antes de mim e eu comentei no começo que não me sentia à altura de estar aqui para discutir no mesmo nível que os outros convidados. Mas fico feliz pelo espaço. Temos muito o que construir ainda, mas estamos muito felizes com o avanço da receita digital, da tecnologia no setor de saúde. A pandemia acabou contribuindo, de certa forma, para que a tecnologia andasse mais rápido dentro do setor, que é um setor mesmo às vezes mais tradicional, mais conservador, e que tem as suas razões para ser assim. Mas olhando para frente, temos que ser capazes de escalar a nossa competência, fazer com que isso não fique restrito a poucas pessoas e que a gente consiga levar isso para a maior quantidade possível de brasileiros, porque é muito bom para todo mundo, tanto para o profissional de saúde quanto para o paciente. Acredito que não tem ninguém jogando contra a receita digital, pelo contrário, mas a missão é grande ainda, temos muitos anos pela frente e a gente vê indícios de que existe um caminho muito feliz pela frente, mas ainda tem muito chão. Dessa forma, vamos seguir trabalhando duro, cuidando dos nossos clientes e dos nossos pacientes com muita dedicação. As portas da Nexodata sempre vão estar abertas para você. Eu agradeço por você ter sido a primeira pessoa do setor que abriu a porta para mim quando eu estava começando a empreender lá em 2015. Então, mais uma vez, muito obrigado! 

  

 

 

 

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