As healthtechs estão cada vez mais presentes na vida das pessoas, que vêm se habituando ao uso das diversas plataformas/aplicativos e aos benefícios proporcionados por eles.
Para o CEO e cofundador da startup Memed (ver box), Ricardo Moraes, as healthtechs unidas em um ecossistema digital de saúde podem trazer mais facilidade e agilidade para os serviços de atendimento de saúde a distância com a criação e desenvolvimento de plataformas, como consultórios inteligentes, prontuários eletrônicos, serviços de telemedicina, plataformas de prescrição digital e e-commerce de medicamentos. “No atual momento de pandemia, por exemplo, um paciente pode passar por uma consulta a distância, receber sua receita médica por SMS e tê-la em mãos em qualquer lugar que ele estiver. Além disso, o paciente pode ter acesso a orientações e outras informações que o ajudarão no tratamento”, relata Moraes.
A adoção dessas e de outras tecnologias no setor de saúde, segundo o CEO da Memed, proporciona aos médicos e à população, de um modo geral, mais segurança e até indicações de onde localizar os melhores preços dos medicamentos prescritos, sempre priorizando a manutenção da qualidade do atendimento. “Porém, no consultório, ainda faltavam ferramentas que ajudassem os profissionais da saúde. O objetivo, então, foi usar a tecnologia para liberar o médico da parte burocrática. No caso da Memed, utilizar a receita médica para permitir que o profissional dedique mais do seu tempo no que realmente importa: o seu paciente”, explica.
Ele comenta que a plataforma digital da Memed é como um ecossistema digital de saúde, conectando médicos, pacientes e farmácias. “Funciona da seguinte forma: o paciente passa pela consulta médica e, após o atendimento, o médico faz a receita na Memed, assina esse documento por meio de um certificado digital e envia a receita digitalmente para o celular do paciente através de um SMS. Desta forma, basta o paciente ir até a farmácia de preferência e apresentar a receita digital ao farmacêutico, que verá todos os itens prescritos e efetuará a venda de forma segura”, esclarece, ressaltando que é possível consultar na própria receita digital da Memed as farmácias mais próximas de onde o paciente está. “Assim, o cliente tem a possibilidade de clicar para comprar on-line e, futuramente, até comparar preços, garantindo comodidade para adesão ao tratamento”, acrescenta Moraes.
Healthtechs e o seguimento da oftalmologia
Existem no mercado algumas healthtechs especificamente com atuação na oftalmologia. Uma delas é a Eyecare Health, que surgiu após o deep dive (metodologia focada na empatia, colaboração e experimentação, objetivando a inovação) que os fundadores da startup, Marco Negreiros, médico atuante em oftalmologia, e Ariadne Dias, médica especialista em Gestão em Saúde, fizeram no ecossistema da oftalmologia em 2019. “Nós sentimos as dores de todos os integrantes desse ecossistema: do paciente, das clínicas e hospitais oftalmológicos, da indústria farmacêutica e de insumos, das farmácias e óticas, das operadoras de saúde e de quem mais paga a conta hoje na saúde suplementar, que são as empresas”, relembra Negreiros.
“Claro que não esquecemos do SUS, no qual eu tenho uma atuação bem presente e vejo que os pacientes da oftalmologia padecem em diversos pontos, desde a enorme fila de espera para cirurgias com potencial de transformar suas vidas, como a de catarata, até o difícil tratamento clínico do glaucoma, repleto de dúvidas e medos”, continua o CEO da Eyecare Health, salientando que no mercado da medicina, o tema saúde baseada em valor (VBHC) estava fervilhando em 2019, com vários congressos e eventos no mundo falando sobre isso. “Observamos que a oftalmologia tinha muitas oportunidades a serem exploradas e melhoradas”, afirma.
Ele conta que a Eyecare Health nasceu com um propósito que será mantido ao longo de sua história: democratizar o acesso à saúde ocular e transformar a maneira como a oftalmologia é feita. “Todos nós sabemos que diversas áreas da saúde sofrem por falta de acesso, mas o dado de que 34% da população brasileira nunca foi a um oftalmologista é impressionante e nos tira da zona de conforto pela busca de mudança. No entanto, para termos êxito nessa jornada, precisamos agregar o interesse de todos os atores envolvidos”, observa Negreiros.
O empreendedor explica que hoje a Eyecare Health é uma Plataforma Oftalmológica Digital que oferece produtos para médicos, clínicas e hospitais se tornarem mais digitais. “Temos o EyecareBI, uma ferramenta clínica para instituições de saúde que fazem atendimento oftalmológico, feita por oftalmologistas para oftalmologistas, o que a torna extremamente amigável para o colega que a está utilizando”, diz, ressaltando que, com isso, há mais agilidade nas consultas (consequentemente mais lucro, visto que gasta-se menos tempo com burocracias), controle dos dados clínicos e financeiros de sua instituição e, futuramente, modelos preditivos que o ajudarão em decisões e, até mesmo, na análise de comportamento de seus pacientes em relação à sua saúde. “O EyecareBI é baseado na ideia de um tripé: prontuário eletrônico especializado, business intelligence e data science”, completa.
Além do EyecareBI, a empresa criou o Glauco, assistente virtual para pacientes com glaucoma. “Ele acompanha toda a jornada do paciente com diagnóstico de glaucoma, com suspeita de glaucoma ou mesmo algum cuidador que pretende acompanhar mais de perto o tratamento que é feito por algum familiar que não é tão adepto de tecnologia”, diz o médico cofundador. Essa ferramenta, de acordo com Negreiros, permite um contato muito mais próximo do paciente com seu médico, o empoderamento do paciente com os dados de saúde na palma da mão, todo o histórico de saúde no mesmo local e organizado ao alcance de um click, lembretes dos colírios, base de conteúdo sobre a doença e outras informações relevantes para a sua saúde ocular.
“Sempre nos preocupamos muito com a segurança dos dados, logo, todas as nossas ferramentas já estão em conformidade com a LGPD (Lei Geral de Proteção dos Dados)”, acrescenta. Segundo o CEO da Eyecare Health, o objetivo da startup é ampliar o acesso aos pacientes tanto para consultas e procedimentos eletivos, quanto para consultas de urgência para casos que podem ser resolvidos por telemedicina, que hoje é resolutiva em até 90% das vezes (de acordo com estudos feitos durante a pandemia). “Esse conceito está em consonância com o nosso propósito e em breve teremos muitos produtos direcionados aos pacientes que não possuem planos de saúde”, prevê Negreiros.
Complemento da medicina tradicional
Na opinião do oftalmologista Paulo Schor, professor associado livre-docente do Departamento de Oftalmologia e Ciências Visuais da Escola Paulista de Medicina (Unifesp/EMP), as healthtecs surgiram para ser um complemento das empresas médicas tradicionais, oferecendo soluções que as mesmas ainda não conseguem alcançar, como avaliação do valor que está sendo oferecido nas consultas oftalmológicas, por exemplo. “As métricas das healthtecs, por serem digitais, são mais rapidamente auferidas e, portanto, conseguem ser auditadas, oferecidas e analisadas de um jeito mais ágil e transversal”, ressalta o médico.
Ele explica que as healthtecs conseguem ter uma penetração maior no mercado da saúde por utilizarem canais diferentes, como as redes sociais ou mesmo as fintechs (startups que trabalham para inovar e otimizar serviços do sistema financeiro) acopladas, para facilitar pagamentos, encontrar médicos mais rapidamente, bem como localizá-los geograficamente. Uma das vantagens deste modelo de saúde, segundo Schor, é reunir pessoas de diferentes estados ou, eventualmente, de diversos países, e fazer com que a solução seja entregue e de valor para aquele público específico.
“Acredito que o que se busca hoje é foco no usuário , e quem não entregar especificamente o que o cliente quer, gastará um dinheiro significativo com marketing”, avalia o oftalmologista, salientando que o usuário busca hoje ser mais visto e atendido em suas necessidades. “Até chegar a uma medicina personalizada efetiva, baseada em genética, comportamento, condição socioeconômica, isso será possível por conta da medicina digital, que tem nas healthtecs o seu braço executor”, observa.
Para Negreiros, as healthtechs trazem celeridade ao processo de inovação dentro da área da saúde. “Hoje, dentro de uma startup, conseguimos acelerar processos de criação e aprovação de novos modelos que, na maioria das vezes, dentro de uma empresa tradicional, seriam burocráticos e demorados. Com os novos modelos de negócios, as healthtechs revolucionam o mercado da saúde, trazendo soluções que são respostas ao esgotamento e às desigualdades do sistema”, enfatiza. Ele afirma que com o envelhecimento e o adoecimento da população, é preciso investir em novas ferramentas que incitem a promoção e a prevenção em saúde e empoderem os pacientes para o autocuidado.
Excelência em saúde ocular
Como parceiros e clientes da Eyecare Health, Negreiros cita o Instituto da Visão em São Paulo (IPEPO) e o Instituto da Visão de Cascavel, duas instituições tradicionais e renomadas na oftalmologia brasileira, as quais entenderam que a união destas ferramentas leva o médico ao encontro do conceito de saúde baseada em valor e a oferecer o melhor cuidado com a saúde ocular para o seu paciente. “Os oftalmologistas destas instituições apoiam a Eyecare Health e veem que ela veio para somar e agregar ao ótimo trabalho que já é feito hoje. É importante relevar que nós, como médicos, queremos que as ferramentas que criarmos auxiliem o oftalmologista a ter melhores resultados, tanto clínicos quanto financeiros”, esclarece.
Segundo o empreendedor, essas soluções podem ser meios de acompanhamento contínuo, de compartilhamento de dados de maneira segura, de otimização de processos de gestão em saúde, ou outros, e todas elas respondem a algum gargalo de um sistema de saúde deficiente e que precisa entregar mais valor para todos os seus atores. “Dentro da Eyecare Health, sempre falamos que nosso objetivo é buscar maior eficiência, com foco em uma melhor experiência para os pacientes e custos controlados para os pagadores, sejam eles quem forem”, destaca, enfatizando que para melhorar ainda mais estes novos modelos, é preciso expandi-los e fazer com que todos os pacientes tenham acesso a eles, da saúde suplementar ao sistema único de saúde. “Apenas desta maneira veremos resultados robustos e que mudem as vidas das pessoas”, analisa.
Paulo Schor comenta que utiliza algumas funcionalidades das healthtechs, como a prescrição eletrônica de medicamentos, com assinaturas e certificações digitais, que é oferecido por algumas plataformas. “Utilizo também alguns aplicativos para verificar a dosagem e disponibilidade de medicamentos, isso é muito importante”, afirma. Além destes serviços, o oftalmologista revela que usa, ainda, as redes para troca de experiências, de conhecimentos e para obter respostas a diversas situações inusitadas.
Ele explica que existem alguns grupos, como o wedoc, por exemplo, que é uma plataforma digital para médicos, que estão fazendo um trabalho bastante interessante, de reunir médicos em um marketplace e oferecendo desde orientações nos serviços domésticos de médico para médico até aulas e propostas de discussão de casos, além de investimentos, cursos de capacitação e recapacitação para seguimento de carreira ou mudança de carreira etc. “Estes nichos parecem ser muito interessantes e eu tendo a seguir esses passos. Creio que as soluções muito globais não funcionaram e, agora, com a digitalização dessas propostas todas, conseguiremos ampliar ainda mais esses serviços , conclui Schor.
Prescrição digital: A tecnologia aliada à medicina
A healthtech Memed nasceu em 2012, em Avaré, no interior de São Paulo, com o objetivo de oferecer um serviço que ajudasse a democratizar a saúde e criar um ecossistema digital que não colocasse uma barreira para que médicos, farmácias e pacientes pudessem utilizá-lo em grande escala. “O projeto surgiu a partir de uma ideia do meu irmão, Rafael Moraes, que é um dos cofundadores da Memed e é médico dermatologista. Na época, recém-formado e iniciando seu consultório, buscava alternativas para facilitar sua rotina de atendimentos. Ele sempre enxergou a tecnologia como uma aliada do médico”, conta Ricardo Moraes.
Foi então que eles criaram uma plataforma de prescrição eletrônica, 100% gratuita, que permite ao médico o acesso a diversas informações atualizadas sobre medicamentos, além de gerar uma receita médica digital e enviá-la diretamente para o paciente, que pode apresentar esse documento na farmácia e efetuar a compra sem mais necessitar de papel. “Com a chegada da pandemia, esse serviço tornou-se essencial para os médicos e as instituições de saúde”, afirma o CEO da Memed. De modo geral, a startup oferece como soluções: plataforma de prescrição (médicos), receita digital (pacientes), produto de integração (hospitais/clínicas/operadoras de saúde/empresas de telemedicina) e produto de dispensação de medicamentos (varejo farmacêutico).
A Memed é atualmente líder no mercado em prescrição médica digital, além de ser uma das primeiras healthtechs do Brasil e uma das principais companhias no mercado de novas tecnologias para o setor de saúde. Recebe o investimento dos maiores fundos de Venture Capital do Brasil: DNA Capital, Redpoint eVentures, Monashees Capital e Qualcomm Ventures. Em janeiro de 2020, a Memed recebeu um novo aporte de R$ 20 milhões do fundo liderado pela DNA Capital e Redpoint eventures, fundamental para impulsionar a transformação do tradicional cenário de receitas médicas manuscritas em receitas 100% digitais e inteligentes.
Rendimentos das startups que atuam em saúde
Dados do Sebrae – Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas – apontam que o segmento de tecnologias e serviços de saúde preventivo dominou o mercado das healthtechs em 2015 e a estimativa é de que ele continue crescendo 12% até 2024, quando atingirá um valor global de aproximadamente US$ 432,4 bilhões. A expectativa é de que o Brasil tenha potencial para ser um dos protagonistas no contexto mundial no segmento. De acordo o relatório Inside Healthtech Report, lançado recentemente, o volume investido nas startups de saúde cresceu em 2020, durante a pandemia, 68% comparado a 2019, o que significa a entrada de mais de US$12 milhões nesse mercado.
Em 2020, apenas na plataforma Memed, o número de receitas triplicou, saindo de 500 mil, para cerca de 1.7 milhão de receitas mensais, e a empresa assinou quase seis vezes mais contratos de integração com instituições de saúde (137 contratos) em comparação a 2019. Atualmente, a plataforma da Memed conta com mais de 120 mil médicos cadastrados e 200 instituições de saúde integradas, como Prevent Senior, Hospital Alemão Oswaldo Cruz, Unimed Campinas e Hospital HC, utilizando a plataforma. “A adesão de farmácias e drogarias foi ainda mais expressiva, saindo de duas lojas na capital paulista para 30 mil em todo território nacional”, comenta Ricardo Moraes.
“O Brasil, com a pandemia, precisou se adaptar e passou pelo processo de aceitação da tecnologia e da telemedicina e vimos o boom das startups na área da saúde. Nos EUA, por exemplo, grandes operadoras de saúde começaram como startups e hoje movimentam um montante financeiro enorme”, diz Marco Negreiros, ressaltando que, fora do Brasil, muitas healthtechs já são unicórnios, o que significa que valem mais do que 1 bilhão de dólares. “No nosso país ainda estamos nesse processo, mas tenho certeza que em breve teremos o primeiro unicórnio da saúde. Uma coisa é certa: este mercado já movimenta bilhões de reais e algumas healthtechs brasileiras já têm faturamento de centenas de milhões por ano”, finaliza Negreiros.
Atuando em prol das startups brasileiras
A Associação Brasileira de Startups (Abstartups) foi criada há dez anos com o propósito de criar uma frente de trabalho mais coesa para atuar em prol das startups brasileiras. Sua missão é advogar pelas startups, pois acredita no poder e no impacto que a inovação e os empreendedores têm não só na economia, como também na transformação social do país.
Para tanto, o time, que começou com três fundadores, é orientado a estudar e criar meios para evoluir, criando oportunidades de inspirar, conectar e crescer conjuntamente com representantes público-privados em benefício geral. “Na prática, temos importantes marcos que ajudaram a entender o setor e levar mais evolução para todos os empreendedores , afirma Felipe Matos, presidente da Abstartups.
Estes marcos, segundo Matos, são a base de dados StartupBase, a Conferência Anual de Startups e Empreendedorismo (CASE) – lançada em 2014 e que, em 2020, reuniu mais de 25 mil pessoas em conteúdos on-line, e o Marco Legal das Startups e a MP da Liberdade Econômica, “da qual participamos ativamente na elaboração, mas que ainda há adaptações a serem feitas”, acrescenta.
De acordo com sua base de dados (https://startupbase.com.br/home/startups), atualmente há 506 startups direcionadas para saúde e bem-estar, a maioria (161) concentrada no Estado de São Paulo, sendo outras empresas (B2B) e também para o consumidor final (B2B2C) os principais públicos-alvo (127 e 116, respectivamente).
Fonte: Revista Universo Visual