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A miopia é o erro de refração mais comum entre os adultos, e está se tornando cada vez mais proeminente. A OMS estima que até 2050 mais da metade da população mundial tenha dificuldade de enxergar objetos distantes, um crescimento de 49% dos casos. No Brasil, o aumento da incidência de miopia deve chegar a 89% nesse mesmo período.
Em pacientes míopes, a refração ocorre antes da retina devido ao crescimento irregular dos olhos, causando o embaçamento da visão de longe. Esse problema é comumente diagnosticado em crianças em idade escolar, que têm dificuldades em acompanhar as aulas, mas, normalmente, pode surgir até o fim da adolescência.
No Brasil, onde a população em média tem olhos menores que em outros países e consequentemente menos casos, os oftalmologistas têm notado uma crescente nos diagnósticos de miopia. Além dos fatores genéticos, uma série de condições ambientais podem estar contribuindo para o aumento da incidência, mesmo em crianças cujo os pais não apresentam o problema. Trouxemos algumas das descobertas mais recentes sobre o tema para auxiliar você, oftalmologista, a orientar seu paciente da melhor forma para prevenir esse problema.
Passamos mais tempo em lugares fechados
O nosso estilo de vida vem mudando. As crianças passam cada vez mais tempo dentro de casa, situação que está sendo agravada durante a pandemia do Novo Coronavírus e tem um impacto duplo no desenvolvimento ocular: falta de estímulo da visão de maior alcance e pouca exposição à luz solar.
Lugares fechados e uso de telas
Os olhos se desenvolvem até os oito anos de idade e, durante esse período, são muito influenciados pelos fatores ambientais, de acordo com alguns estudos. Passar muito tempo em lugares fechados, realizando tarefas que estimulam apenas a visão de perto, como ler, estudar e utilizar dispositivos eletrônicos, vem sendo cada vez mais associado ao agravamento da miopia. O professor Dr. Earl L. Smith, da faculdade de Optometria da Universidade de Houston, aponta em uma pesquisa que quanto maior a carga de estudos maior o risco de desenvolver o quadro. Ele usa como exemplo os próprios alunos: em quatro anos de curso, 50% deles têm piora no erro de refração.
Quanto ao uso de telas, o efeito é o mesmo. Ao utilizar o tablet ou o smartphone, a criança acomoda o foco excessivamente para um objeto próximo (a tela). Por isso, o oftalmologista deve orientar os pais a limitarem o uso desses dispositivos e a incentivarem seus filhos a fazerem pequenos intervalos durante as atividades e estudos para olhar pela janela, por exemplo. Assim é possível reduzir os danos causados pelo foco excessivo em objetos próximos.
Luz solar e o desenvolvimento dos olhos
Já com as atividades em espaços abertos, além de olhar mais para o horizonte, as crianças também estão mais expostas à luz solar. A luminosidade estimula o desenvolvimento de dopamina, hormônio que controla o crescimento dos olhos e que vem sendo cada vez mais associado à inibição do progresso e do desenvolvimento de miopia.
Um estudo realizado com 952 crianças com idade média de seis anos na China constatou que com 40 minutos de atividades ao ar livre houve uma redução de 23% na incidência de miopia. Já um outro experimento conduzido em Taiwan, demonstrou uma redução de 54% na progressão do quadro tanto em crianças que já eram míopes quanto nas que ainda não apresentavam o problema. Nesse caso, as atividades ao ar livre ocorriam por 11 horas distribuídas em uma semana.
Durante a consulta, é importante que o oftalmologista busque conhecer os hábitos de seus pacientes, principalmente as crianças, e quando necessário indique mais tempo de lazer ao ar livre.
Sono e miopia
O sono é um momento de desenvolvimento e recuperação para todo o corpo, inclusive para os olhos. E dormir tarde ou pouco pode aumentar as chances de surgimento e progressão da miopia. A suspeita é de que haja relação entre os níveis de melatonina (o hormônio do sono) no corpo e o crescimento anormal dos olhos. 
Em um estudo publicado em 2017 no Ophthalmic & Physiological Optics Journal, os pesquisadores encontraram níveis do hormônio três vezes maiores em pacientes adultos com miopia do que naqueles que não tinham o problema. Apesar de não chegarem a uma conclusão sobre o tema, os cientistas acreditam que é uma pista de como o nosso estilo de vida impacta na saúde ocular. 
Como frear o aumento da incidência de miopia
O aumento da incidência de miopia parece estar ligado ao nosso estilo de vida e é agravado pelo isolamento social durante a pandemia. Apesar de ser impossível deixar esses comportamentos de lado, é possível orientar os pais a buscarem um equilíbrio a fim de frear o desenvolvimento do problema, principalmente em crianças. 
Brincadeiras ao ar livre: As crianças devem passar, pelo menos, 1h por dia brincando ao ar livre. É necessário ressaltar a importância do uso de máscara e o distanciamento social enquanto enfrentamos o Novo Coronavírus.
Limitar o uso de aparelhos eletrônicos: A OMS recomenda que bebês e crianças de até dois anos não tenham acesso a esses dispositivos. De dois a cinco anos, o tempo em frente a telas deve ser de no máximo 1h por dia. Acima dos cinco anos, esse tempo sobe para 2h.
Intervalos durante o tempo de tela: Além de horários limitados, é importante fazer pequenas pausas a cada 20 minutos em frente às telas. Durante esse período, os pais podem incentivar as crianças a andarem pela casa e olhar pelas janelas.
Desligar os eletrônicos 1h antes de dormir: A luz emitida pelas telas interfere na produção do hormônio do sono. Desligá-las 1h antes de ir para cama ajuda o corpo a se preparar para dormir e ter um sono de qualidade.
Alimentação: O excesso de açúcar também interfere no crescimento dos olhos. A OMS recomenda até cinco colheres por dia para as crianças.
Além de diminuir as chances do desenvolvimento de miopia, esses comportamentos também inibem a sua progressão em quem já apresenta o quadro. Por conta disso, é importante que o oftalmologista busque entender durante a anamnese quais são os hábitos de seus pacientes para identificar situações que possam agravar o problema e indicar as mudanças necessárias.
Tratamento precoce
Se não tratada, a miopia pode se agravar e levar a quadros de deslocamento da retina, catarata precoce, degeneração macular, glaucoma e, consequentemente, à cegueira. Por isso, os pais devem ser alertados sobre a importância de levarem seus filhos regularmente ao oftalmologista para acompanharem o estado da saúde dos olhos e o desenvolvimento do problema.
Com o diagnóstico precoce, é possível indicar duas terapias que contribuem para o controle da miopia. O uso de colírio de Atropina diluído a 0,01%, adquirido apenas com receita, reduz em 50% a progressão do quadro. Ele pode ser manipulado em crianças de 6 a 15 anos, mas o médico deve ficar atento à reação do paciente. Como o medicamento embaça a visão e causa fotofobia e ardência nos olhos, pode não ser bem tolerado.
Outra opção são as lentes ortoceratológicas rígidas que contribuem para aplanar a córnea durante o sono sem causar desconforto. Elas são recomendadas para casos em que o grau é moderado.
Em casos mais avançados, em que o grau utilizado pelo paciente é elevado, o oftalmologista pode investigar a possibilidade de realizar a cirurgia refrativa.
Para evitar que as previsões da OMS sobre aumento dos casos de miopia não se cumpram, é preciso um esforço conjunto de oftalmologistas, pais e pacientes para controlar a exposição aos fatores de risco. 
Fontes:
HALTING Nearsightedness Epidemic Goal of UH Vision Scientist: Earl Smith Takes Myopia Research to Next Level with $1.9M NIH Grant. 
Digital Screen Time During the COVID-19 Pandemic: Risk for a Further Myopia Boom? American Journal of Ohptalmology

Fonte: Revista Universo Visual

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