Aline do Lago, MD, PhD, MBA @dra.alinelago
Staff do Setor de Retina UNIFESP-EPM
Empresária e Oftalmologista
Sócia do Instituto da Visão de São José dos Campos @ivisaosjc
Autora do Livro ; Médicos o App está dentro de você @editoraleader
CEO e fundadora do App de relacionamento DSLove @aplicativodslove
O dia a dia do profissional médico exige muita dedicação à carreira, independente de quanto tempo ele está formado. Com a pandemia, o desgaste psicológico e físico acabou trazendo à tona, questões mais íntimas que estavam “debaixo do tapete” para todos nós.
Devido ao confinamento, o medo de ficar doente e de morrer e o aumento da demanda por consultas nos hospitais médicos, muitos de nós chegaram ao limite. Depressão, divórcios, suicídios, desemprego, transições de carreira…sem contar as complicações pós COVID e as questões políticas e econômicas de uma guerra que ainda não acabou.
Foi logo no início da pandemia que tive a oportunidade de escrever o meu livro Médicos – o App está dentro de você. Estava fazendo um MBA em Gestão em Oftalmologia pelo IPEPO, que é ligado à minha faculdade, UNIFESP-EPM e tinha que entregar um TCC. Entre muitos assuntos que pude aprender no curso, chamou-me a atenção os recursos humanos e as ferramentas de gestão de controle emocional que foram apresentadas. Na mesma época do MBA, eu estava me recuperando de uma separação que me deixou muito mal e tentando entender os motivos que levaram ao término do relacionamento, procurei ajuda com psiquiatras, psicólogos e coaches. Nesse momento do tempo, um universo de novos conceitos e conhecimentos se abriram diante de mim, e isso me estimulou a estudá-los mais a fundo.
Paralelamente ao MBA, ao meu trabalho na minha clínica em São José dos Campos, o Instituto da Visão de São José dos Campos e o dia a dia com meus filhos, mergulhei em diversos cursos e retiros. Fiz Programação Neurolinguística, Hipnose, Eneagrama, Constelação Sistêmica, Física Quântica e Comunicação Não Violenta. A cada curso que fazia, a mesma pergunta vinha à minha cabeça: Por que isso não é ensinado nas faculdades de Medicina?
Na posição de aprendiz, o médico consegue usar as competências que o ajudam a pensar estrategicamente, a saber correr riscos, a formalizar incertezas e a relacionar-se com pacientes e prestadores de serviço, fazendo uso de sua liderança, de forma inata ou modelada pelos seus professores. Não há, entretanto, acesso a um ensino que abrace a parte técnica – científica à parte psicológica e de autoconhecimento. Então, eu enxerguei a possibilidade de trazer o profissional médico para mais perto de si mesmo. Para isso, é fundamental o autoconhecimento.
Nos meus processos pós separação e diante das dificuldades que tinha ao lidar com os pacientes devido à minha comunicação por vezes, atravessada e sem empatia, percebi a importância dessas ferramentas que havia aprendido nos cursos que tive e quiz compartilhar a minha experiência pessoal com meus colegas. Daí, saiu a ideia do livro que derivou do TCC.
Encarar nossos defeitos, nossas sombras, demanda do profissional médico, acessar a sua própria vulnerabilidade. É exatamente através dela que nos tornamos mais corajosos, mais conscientes e mais felizes.
“A dor é o buraco pelo qual a luz entra” (Rumi)
Diante das evidências claras de que esse é o caminho a ser seguido, entendi que a Medicina transcende e muito o que aprendi na faculdade.
Medicina é sobre Amor. Somos corpo, mente e espírito. Por isso, não adianta apenas cuidarmos do corpo/matéria que conseguimos ver. É muito mais do que isso. A saúde precisa ser completa: física, emocional, mental e espiritual. Devemos amar e cuidar de todas essas nossas partes. Se uma delas for deixada de lado, adoecemos. Simples assim.
Nesse período recente de pandemia que vivemos, isso ficou mais claro ainda. Relacionamentos terminaram, pessoas adoeceram, morreram, aumentou o número de depressões. A sociedade está doente. O materialismo é a lei nas redes sociais. Falar sobre amor, expansão da consciência e saúde integral não traz o mesmo número de curtidas e seguidores que uma dancinha do Tik Tok. Quanto mais inconscientes formos, mais manipulados seremos.
Diversas práticas guiam o caminho para o autoconhecimento e objetivo desse artigo será apenas resumi-las pois cada uma delas dariam vários livros. A maioria de nós sai com habilidades clínicas e técnicas excelentes da faculdade. Graduação, residência, subespecialização, mestrado, doutorado, línguas, certificações, livros e artigos científicos habilidades cirúrgicas, etc…Estas são as chamadas hard skills, mas alguns médicos não conseguem decolar…o que pode ser?
A resposta pode estar nas soft skills, que são definidas como qualidades interpessoais e são habilidades relacionadas ao comportamento humano: empatia, colaboração, boa comunicação, flexibilidade, liderança. Elas podem ser inatas ou adquiridas, e são difíceis de serem analisadas num primeiro contato, daí sua importância vital. Não adianta afinal nos dias de hoje, um profissional ser extremamente capacitado ou super inteligente. Se ele não estabelecer um bom rapport com o paciente ou com o staff, o cuidado e as condutas de seguimento ficam comprometidas. Um médico que tem interações positivas com seus pacientes e colaboradores, tem mais chance de promoção e de novas oportunidades, além do aumento da cura dos seus pacientes.
O LinkedIn em 2019 elencou as soft skills entre as grandes tendências de mercado e a importância da inteligência emocional desde Goleman em 1995, vem crescendo dentro das empresas e hospitais do mundo. As principais soft skills na área médica são:
- Empatia : é reconhecer as emoções dos outros, poder entende-las e dividi-las. A presença de empatia melhora a adesão ao tratamento médico. Entretanto, no curso da faculdade de Medicina, o que geralmente acontece é o contrário , os médicos vão se tornando insensíveis
- Apreço e respeito pelos outros.
- Comunicação: é a habilidade de dialogar com os outros para evitar conflitos, resolver divergências e eliminar ruídos que prejudicam a realização de tarefas.
- Escuta: escuta ativa, verbal e não verbal. É uma demonstração de interesse genuíno.
- Colaboração e trabalho de equipe: o médico deve reconhecer suas forças e fraquezas assim como as do seu time.
- Resiliência: é a capacidade de se adaptar e continuar produzindo diante das mudanças de cenário, mesmo após experiencias difíceis e que trouxeram prejuízos, mas também lições. No cenário de pandemia que estamos ainda, é a mais importante de todas.
- Liderança: é a capacidade de inspirar funcionários e motivar equipes a entregar resultados, saber quando servir de exemplo, quando delegar tarefas e como cobrar desempenho sem constranger o time.
- Habilidade de receber feedback: os médicos de sucesso devem estar abertos a aprender, entender e explorar novos conceitos todos os dias, ou seja, serem vulneráveis e humildes.
“As pessoas são admitidas pela competência técnica e demitidas por mau comportamento.” Peter Drucker
O fato é que em todas as organizações, as relações estão se tornando mais horizontais com maior colaboração, relacionamento interpessoal, comunicação, flexibilidade, ética e equilíbrio emocional, sendo que os médicos, agora fazem parte da equipe, com mais foco no cliente e sem tanta hierarquia.
O livro então se torna muito importante, principalmente nessas épocas em que estamos todos à flor da pele pelas consequências físicas, mentais, políticas e econômicas que vivenciamos nessa pandemia. É sabido que os médicos tendem a ter mais dificuldade de olhar para dentro. Apesar de termos feito o juramento de cuidar do bem-estar do outro, é preciso primeiro cuidar de nós mesmos. Trata-se exatamente do que se ouve antes de um avião decolar: coloque a mascara de oxigênio em você, e, somente depois, ajude as outras pessoas.
Em um mundo em constante e rápida transformação, onde as máquinas e a inteligência artificial vem avançando dentro da profissão médica, o profissional precisa se reinventar e tentar oferecer novas soluções para clientes e pacientes, ter flexibilidade para se adaptar a diferentes situações na rotina de trabalho e gerenciar bem seu tempo. Para isso é preciso se conhecer melhor a fim de levar o que você tem de único para o mundo.
Por esse motivo, tem-se buscado dentro de fora das escolas de Medicina a reumanização. Humanizar pode ser concebido por uma escuta atenta, uma boa relação médico-paciente, reorganização de processos de trabalho (que facilite o acesso aos serviços), criação de ouvidoria e balcões de acolhimento e até a melhora dos espaços físicos.
Uma visão holística do mundo, onde é superado o saber disciplinar do ensino tradicional, resgatando o conhecimento do ser humano na sua totalidade e estabelecendo uma educação global, na qual temas éticos, humanos e sociais serão inseridos. Afinal só podemos considerar uma verdadeira evolução do conhecimento biológico médico quando há integração de todos os saberes que extrapolam o campo físico experimental.
“Seja humilde, se quer adquirir sabedoria: seja mais humilde ainda quando a tiver adquirido. Seja como o oceano que recebe todos os rios e riachos. A calma imensa do oceano não se perturba, recebe-os e não os sente”. Helena Blavatsky
Só descobrimos o que nos serve e o que não nos serve quando experimentamos. Então agora abertos e mais vulneráveis ao novo, vamos então às principais ferramentas de autoconhecimento;
1 – Meditação
A arte de silenciar a mente é uma técnica, um exercício que deve ser feito diariamente. Não há autoconhecimento sem presença. O espaço criado entre um pensamento e outro é o que nós somos. Nós não somos nossos pensamentos. Assim, existem diversas formas de meditar. Cada um deve descobrir a que melhor se encaixa para si mesmo. E praticar todos os dias, pois a atenção é como um músculo, quanto mais treinado, mais forte fica. Quando em meditação saímos da conexão e apego aos nossos pensamentos e passamos a observá-los sem julgamentos, sabendo que sendo eles “bons”ou “ruins”, eles também vão passar. Diversos estudos científicos mostram que meditadores regulares são mais felizes e satisfeitos do que a maioria das pessoas. A memória melhora, casos de depressão e ansiedade podem ser tratados meditando assim como ela é relacionada a uma vida mais longa e saudável. A meditação faz parte do processo de autoconhecimento, pois se estamos mais centrados e presentes, sabendo que não somos nossos pensamentos, podemos fazer melhores escolhas, enxergando que há diversas possibilidades, ter mais controle emocional e agir de acordo com nossos verdadeiros valores. Dessa forma saímos do modo sobrevivência (sistema luta-fuga do cérebro-sistema límbico) para o modo existente, utilizando o córtex pré-frontal.
2 – Eneagrama
É uma ferramenta muito poderosa de autoconhecimento, pois ela gera clareza das reais motivações que determinam nossas decisões. Com a presença adquirida através da meditação, escolhemos agir de forma mais consciente, evitando cair em padrões de comportamento, nos tornando protagonistas de nossas histórias .
O Eneagrama é um sistema de desenvolvimento pessoal, profissional e organizacional, que descreve nove tipos de personalidade, cada um com suas tendências de mentais, emocionais e instintivas, que refletem um estilo central de liderança assim como na vida. É um mapa que torna as pessoas menos julgadoras, mais abertas e acessíveis. Ele nos traz clareza sobre os nossos caminhos individuais de crescimento, assim como mostra possíveis obstáculos que podem aparecer na nossa vida pessoal, profissional e emocional.
Ele é muito mais do que uma tentativa de classificar pessoas. Ele mostra a real motivação por trás das ações, crenças, estratégias inconscientes por trás das nossas decisões, trazendo rotas para desenvolvimento e crescimento. O médico além de poder utiliza-lo nele mesmo, pode ajudar sua equipe, sua família, seus amigos, convidando a todos a fazerem o mesmo movimento, melhorando a si mesmo e ao seu entorno.
Não cabe a esse artigo, explicar cada uma das personalidades, mas resumidamente posso dizer que há 3 personalidades instintivas (tipos 8,9 e 1) com derivações do tema, 3 emocionais (2,3 e 4) e 3 mentais (5,6 e 7). Em cada tríade, um centro de inteligência predomina em detrimento dos outros dois. Um dos objetivos do eneagrama é integrar os três centros (corpo, mente e emoções), levando o indivíduo a ter mais equilíbrio emocional, mais consciência de si mesmo e ser mais feliz.
Os corporais ou instintivos são pessoas que percebem o mundo através das sensações do corpo. São rápidos e não precisam pensar muito para fazer. O corpo funciona como uma bússola e a questão central é a raiva.
Os emocionais preocupam-se com a aula imagem, com o feedback, pois percebem a realidade através das emoções. Tem necessidade de serem queridos, empáticos e adaptáveis e muito do que fazem é para evitar a rejeição. A questão central é a tristeza (abandono e vergonha).
Os mentais são pessoas que tentam entender de maneira racional antes de agir. Pensam no lugar de sentir e precisam de certezas. A questão central é o medo.
O Eneagrama é um sistema de libertação, da lembrança da parte mais divina de si mesmo e não um sistema de esteriótipos e de rótulos.
3 – Programação neurolinguística
A PNL veio da observação de que a repetição de comportamentos verbais e não verbais de grande terapeutas em seus pacientes alteravam o comportamento humano. A esse processo, em 1970, Bandler e Grinder chamaram de modelagem. Hoje a PNL é a essência de muitas abordagens que vão além da comunicação e que visa mudar padrões de comportamento, emoções e pensamentos para que se possa atingir resultados satisfatórios.
Por meio da PNL, é possível ter mais domínio sobre os próprios pensamentos, emoções e comportamentos. As relações interpessoais melhoram, assim como a capacidade de identificar e argumentar o que realmente se deseja. Há mais clareza na definição dos objetivos e um aprimoramento de competências e habilidades. A comunicação se torna mais eficaz e efetiva. O autoconhecimento pode aumentar junto com a maior confiança e domínio sobre si mesmo. É uma metodologia que foca no alcance da excelência, levando a pessoa a atingir os resultados que deseja em sua vida a partir de atitudes de sucesso.
Ao longo da nossa vida há um desalinhamento entre o que acreditamos e aquilo que esta acontecendo na prática. Isso desordena os níveis neurológicos e por não estarmos em congruência, acabamos por cair nos padrões e andar em círculos . A PNL pode ser trabalhada em 6 níveis neurológicos distintos mas que se intercomunicam; ambiente (onde reagimos), comportamentos (o que fazemos), capacidade (como fazemos), crenças e valore
s (por que e para que fazemos), identidade (quem faz), espiritual (quem mais faz).
Bom, diante de tantas informações aqui resumidas brevemente, e considerando o contexto mundial em que todos estamos inseridos, convido você, oftalmologista a abrir os olhos para si mesmo e enxergar que sua vida pode ser muito mai
s próspera e feliz em todas as áreas se houver humildade para reconhecer seus defeitos e coragem para transformá-los em virtudes. Sinta no seu coração o chamado!!!
(Mais informações no meu livro Médicos – o App está dentro de você, pela Editora Leader ou na Amazon. podem me chamar no Instagram @dra.alinelago).