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Sancionada em 2018, mas em vigor desde setembro de 2020, a Lei Geral de Proteção aos Dados Pessoais, conhecida pela sigla LGPD, já faz parte dos hábitos dos brasileiros. No aviso em cada site visitado ao consentimento verbal nas lojas físicas, a preocupação com as normas e a proteção das informações já se faz presente. Tal atenção também está no dia a dia de médicos e organizações de saúde com processos que buscam garantir a governança de todos os dados dos pacientes sem impedir sua utilização para melhorar o atendimento.

Poucos setores tiveram que se adaptar tanto à nova lei do que o da saúde. Além da necessidade básica de respeitar as regras para evitar as sanções estipuladas, a área ainda encara constantemente um dilema que não foi completamente solucionado: as informações médicas são consideradas pessoais ou sensíveis? A definição do texto não esclareceu totalmente a questão, mas legislações posteriores, como a do Prontuário Eletrônico, deram mais segurança ao tema.

Em todo o caso, o debate sobre o que seria pessoal ou sensível ficou em segundo plano. Afinal, a LGPD coincide justamente com a maior influência das informações no expediente de médicos e demais profissionais da área. Hoje, é impossível ignorar a importância dos dados na tomada de decisão sobre um tratamento, na humanização das consultas e até nos melhores diagnósticos.

Em suma: não importa se os dados são classificados como pessoais ou sensíveis. O importante é reconhecer que eles são fundamentais em qualquer clínica, consultório ou hospital.

Não à toa, o percentual de médicos brasileiros que sempre utilizam ferramentas digitais para consultar essas informações além do atendimento passou de 49,5% em 2016 (menos da metade) para 80,6% em 2022, de acordo com o levantamento TIC Saúde, realizado pelo Comitê Gestor de Internet no Brasil (CGI.br). Isso explica porque mais de dois terços (68,1%) deles estão motivados em utilizar estes dispositivos em seus trabalhos, segundo o mesmo estudo.

Esses números apenas comprovam o impacto dos dados na rotina médica, principalmente após a pandemia de covid-19. Mas o que mudou nessa percepção com a LGPD? Basicamente duas atividades tornaram-se essenciais graças à lei: a inclusão dos pacientes no trabalho com os dados, principalmente por meio do consentimento, e a consequente atenção ao que, de fato, é importante para a consulta médica e o que pode ser descartado sem afetar a qualidade.

Aprovação dos usuários traz dados melhores

A premissa fundamental da Lei Geral de Proteção aos Dados Pessoais é a transparência. Isso implica, portanto, que o usuário – independentemente do setor de atuação da empresa – precisa dar seu consentimento sobre a utilização de uma determinada informação e o que a organização pensa em fazer com ela. Não dá mais para simplesmente pegar todo e qualquer dado do paciente e fazer o que bem entender, compartilhando inclusive com parceiros.

Hoje, o consentimento é uma etapa obrigatória em qualquer consulta. Antes de começar a conversa, o paciente precisa ter consciência dos seus direitos e de quais serviços/tratamentos as informações que ele passar poderão oferecer. Sim, tudo o que é tratado e conversado em uma consulta já é confidencial, mas ter essa etapa de consentimento é fundamental para evitar problemas futuros.

A boa notícia é que esta etapa trouxe uma vantagem importante que acabou impulsionando ainda mais o uso dos dados: o enriquecimento das informações. Uma das dificuldades das organizações de saúde era lidar com dados “pobres”, ou seja, incompletos e/ou desatualizados, principalmente relacionado ao histórico médico, receitas, etc. Com o consentimento, abre-se a oportunidade para atualizar o prontuário eletrônico e ter insights melhores na tomada de decisão.

Separar o ‘joio’ do ‘trigo’ nos dados médicos

Além disso, essa etapa anterior de consentimento e validação dos dados dos pacientes permitiu também que os médicos possam refletir sobre a própria necessidade de determinada informação para o seu trabalho. Afinal, a lógica é simples: se há uma preocupação adicional com o armazenamento, tratamento e utilização dos dados, o ideal é manter apenas aqueles que realmente são mais importantes para o setor.

Poucos profissionais de saúde percebem, mas uma simples consulta consegue capturar diferentes dados sobre a pessoa, desde as mais simples, como local de nascimento, endereço e idade, até as mais complexas referentes ao problema a ser tratado e eventuais diagnósticos. Saber qual deles é mais importante para auxiliar no tratamento é um desafio crescente para a área.

Mas ao permitir o consentimento, o médico consegue se antecipar a esse problema e fazer um exercício mental do que ele precisa descobrir e de quais informações podem ser úteis. Assim, o que ele não utilizar pode ser simplesmente descartado ou até armazenado para análises posteriores dependendo do trabalho a ser feito (sempre com a aprovação do paciente!).

LGPD colocou dados no centro do debate médico

Hoje, não se discute mais a importância que os dados possuem dentro de um consultório médico. Dos mais tradicionais, como resultados de exames, aos rastros digitais que a pessoa compartilha, toda informação pode ser útil e ajudar no tratamento de uma doença. O conhecimento adquirido nas salas de aula continua necessário, não há dúvidas, mas a época de confiar apenas no que aprendeu na universidade ficou para trás. O médico pode – e deve – buscar novas fontes para tomar as melhores decisões no seu dia a dia.

O surgimento da LGPD e a sua consolidação nestes três anos são exemplos deste novo momento para o setor de saúde, em que o digital ganha cada vez mais espaço – seja nos dados compartilhados por dispositivos tecnológicos ou pelo prontuário eletrônico cada vez mais importante. É como se fosse um lembrete para que todos os profissionais enxerguem o que pode fazer diferença em seus expedientes. Como se vê, o uso correto dos dados é um caminho sem volta para a medicina.

Fonte: Saúde Business

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