Nesses últimos anos fiz valorações de diversas clínicas, seja para negociação entre os sócios para uma mudança de posição de quotas, seja para venda a terceiros ou ainda fusões entre clínicas.
Existem diversos métodos de valoração – todos válidos e com sua lógica. Nessa coluna vou tratar daquilo que é comum entre todos os métodos: a necessidade de dados bem coletados e algumas outras considerações para o estabelecimento do preço.
Já imaginaram o que poderia acontecer quando vocês, oftalmologistas, fizessem suas medições para determinar a lente a ser utilizada numa cirurgia de catarata ou refrativa e coletassem dados incorretos?
Ou se antes da cirurgia recebessem exames de sangue feitos sem o rigor técnico necessário e viessem resultados não condizentes com a realidade?
A chance de insucesso no procedimento é enorme, coloca em risco a vida e/ou a visão do paciente e pode trazer consequências graves em suas carreiras.
A lição aqui é a mesma: tomar decisões com base em dados fidedignos e precisos. Significa que os dados de produção, cobrança, número de pacientes e atendimentos, cadastro de convênios e outros itens estarem estruturados de maneira simples e de fácil acesso para se poder fazer o cálculo, seja lá qual for a metodologia utilizada para determinação do valor da clínica.
Sem esses dados de base, o valor calculado poderá ser bem diferente do que o mercado ou um potencial comprador reconhecerá e sua decisão de definir o melhor preço poderá estar comprometida.
Além desses dados operacionais em dia, deve-se pensar em ter os equipamentos contabilizados corretamente, empréstimos a sócios ou retiradas de lucro registrados, contas particulares separadas as contas da clínica, contrato social espelhando a realidade da sociedade, entre outros.
Se um equipamento é adquirido em nome da pessoa física, ele não poderá ser contabilizado e no momento da valoração da clínica, esse item terá que ser considerado de maneira especial – ele até pode compor o valor, porém, provavelmente o comprador imporá um agravo no preço, já que ele deverá, de alguma forma, incluir posteriormente esse ativo em seu balanço e assim justificar despesas e investimentos (manutenções, reformas) e até uma possível venda ou troca desse bem.
Outro exemplo que pode reduzir o valor da clínica se refere a atualização do contrato social. Como exemplo: se um sócio vendeu suas quotas, tudo foi resolvido e pago, mas não se refletiu no contrato social. Na hora de uma venda a terceiros, esse sócio que saiu, terá que assinar essa venda e necessariamente receber em sua conta a sua parte. Ora, se ele já saiu, qual seria a razão dele receber essa parte? E será que ele assinaria a venda, mesmo se fizesse um acerto posterior, repassando o valor da venda? Ainda assim, haveria um custo tributário para se fazer esse acerto, supondo que a saída dele tenha sido amigável e ele esteja disposto a cooperar.
Ainda sobre o contrato social, se ao longo do tempo seu capital não tenha sido corrigido por conta de aquisições de equipamentos ou melhorias ou ainda com a incorporação de lucros, no momento da venda incidirá imposto sobre a diferença do valor da venda e o do capital social. Então, quanto maior for o capital social, menor será a base de cálculo do imposto sobre a venda. Ressaltando que essa atualização tem que ser feita ao longo do tempo e não ó possível fazê-la de uma vez só, quando se está prestes a fazer uma transação de venda.
Contas da pessoa física (médicos sócios da clínica) misturadas com as da pessoa jurídica (da clínica) também dificultam a determinação do valor, pois podem mascarar uma situação irreal das despesas da clínica – sempre lembrando que numa transação com terceiros, certamente haverá uma auditoria para verificação da veracidade dos números, antes da assinatura dos contratos.
Uma verificação da contabilidade, de tempos em tempos, também é saudável. Já tive caso em que o vendedor teve que refazer 5 anos de contabilidade para ajustar um erro cometido e para que o comprador aceitasse como tudo correto. Isso representa custo ao vendedor além do tempo de espera adicional e portanto redução do valor a receber.
A conclusão a que sempre chego é que quanto melhores forem os controles, a coleta de dados, a contabilização correta nos balancetes e balanço, a atualização do contrato social, maiores as chances de se conseguir um preço melhor no momento da venda de quotas ou da clínica como um todo.
Mas, quando é melhor se preocupar com isso? Apenas quando estiver perto de parar de trabalhar?
Não! Essa é uma preocupação desde já, para que tudo fique mais simples no momento de uma negociação – agora ou no longo prazo.
Vale pensar: preparar e resolver agora para facilitar depois!