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Por Tatiana Ferrador
A membrana amniótica tem sido cada vez mais presente no campo da oftalmologia, pois exerce função regenerativa na reconstrução da superfície ocular. Utilizada na reparação tecidual por conter vários fatores de crescimento, macromoléculas importantes na cicatrização e por suas propriedades anti-inflamatórias, auxilia no tratamento de diversas doenças, dentre as quais se destaca a cirurgia vitreorretiniana, realizada para enfermidades oculares como hemorragias vítreas, trações vitreorretinianas, edemas maculares persistentes, descolamentos de retina tracionais ou outros tipos de descolamentos de retina.
Para entender mais sobre o tema, a Revista Universo Visual entrevistou o especialista em Retina e Mácula, Gabriel Costa de Andrade, Doutor em Oftalmologia e Ciências Visuais pela UNIFESP/EPM, membro do Setor de Farmacologia Ocular de Departamento de Oftalmologia e Ciências Visuais da UNIFESP/EPM, membro titular da Sociedade Brasileira de Retina e Vítreo (SBRV), Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), American Society of Retina Specialists (ASRS), American Academy of Ophthalmology (AAO), Association for Research in Vision and Ophthalmology (ARVO). Autor do livro: Atlas de doenças da Macula e Angiografia por OCT, tem experiência na área de Oftalmologia, com ênfase em imagens e cirurgia de Catarata, Retina e Macula.
Universo Visual: Quais os principais indícios das patologias da interface de cirurgia vitreorretiniana? Há sintomas mais comuns?
Gabriel Costa de Andrade: Os principais sintomas das patologias de interface vitreorretiniana são baixa visão central e metamorfopsia, que é um distúrbio visual caracterizado pela distorção de parte da visão. Assim, linhas retas parecem tortas, superfícies planas parecem distorcidas e/ou objetos não são completamente vistos. Ao exame clínico, os primeiros indícios que notamos são irregularidade nas camadas mais superficiais da retina, e entre essas, estão a adesão vitreomacular (evidência de descolamento do córtex vítreo da área perifoveal), tração vitreomacular e o desenvolvimento de membranas epirretinianas. Em casos mais avançados de tração vitreomacular, observamos a formação de buraco macular.
UV: Quando a cirurgia vitreorretiniana é indicada?
Andrade: É indicada no momento em que o paciente tem prejuízo visual, reservada para casos avançados como hemorragias vítreas, trações vitreorretinianas, edemas maculares persistentes e/ou descolamentos de retina tracionais. Geralmente pacientes com membrana epirretiniana (tecido fibroso que cresce sobre a área macular levando ao enrugamento da retina, edema e consequente piora visual), buraco macular, ou mesmo tração vitreomacular, devido à urgência de prejuízo visual do paciente, há a indicação da cirurgia. Ou seja, a cirurgia de vitrectomia é indicada, principalmente, para o tratamento de algumas doenças ligadas à retina e ao gel vítreo.

UV: Sobre as técnicas operatórias, quais são as mais comuns?
Andrade: Elas podem variar de acordo com o caso do paciente, podendo ser associado a outros procedimentos cirúrgicos oculares, mas no caso da Vitrectomia, cirurgia combinada de catarata + vitrectomia, com a remoção do vítreo, algumas substâncias são utilizadas nos procedimentos permitindo uma maior estabilização do folheto retiniano, melhorando a hemostasia intraoperatória e um melhor resultado cirúrgico como:  Perfluorcarbono líquido (pesado e transparente), óleo de silicone e Gás C3F8 ou SF6. Cada uma dessas substâncias é utilizada em tempos específicos dos procedimentos e com suas indicações variando com o caso em tratamento. A utilização da cromovitrectomia, uso de corantes vitais (facilitando a remoção de algumas membranas retinianas e vítreas) também auxiliam na melhora substancial dos resultados cirúrgicos.
UV: Há algum tratamento considerado mais seguro para o paciente quando falamos em cirurgia vítreorretiniana?
Andrade: Com os recentes avanços na cirurgia vítreorretiniana o tratamento é realizado de forma cada vez mais precoce, uma vez que os últimos desenvolvimentos permitem realizar a vitrectomia via pars plana de forma mais segura e controlada. A técnica cirúrgica básica consiste na indução de um descolamento da hialoideia posterior associado posteriormente à remoção das trações na superfície da retina, eventualmente com remoção da membrana limitante interna. Na maioria dos casos, com excepção do buraco macular, não é necessário utilizar tamponamento de longa duração. Atualmente a vitrectomia pars plana é a técnica cirúrgica de primeira escolha pela maioria dos cirurgiões de Vítreo e Retina com alta taxa de sucesso. Lembrando, no entanto, que o prognóstico visual é variável para cada caso, de acordo com a gravidade do descolamento de retina.
UV: Como é realizada a cirurgia?
Andrade: É realizada sob anestesia local e sedação, em ambiente controlado, como hospital ou centro cirúrgico especializado em oftalmologia. Com a infusão do corante azul brilhante que tem por objetivo identificar e coroar a membrana limitante interna que é posteriormente removida através de uma pinça de pequeno calibre.  Temos utilizado uma técnica para buracos de mácula largos, crônicos ou com baixa altura onde não temos o tecido retiniano suficiente para promover o fechamento do buraco, a utilização de um tecido extra, a membrana amniótica que é colocada sobre a face da retina.
UV: Por favor, explique melhor sobre os benefícios do uso da membrana amniótica em cirurgias oculares.
Andrade: A utilização da membrana amniótica em procedimentos oculares baseia-se na capacidade de beneficiar o processo de epitelização por facilitar a adesão e migração das células epiteliais basais, prevenir a apoptose e restaurar o fenótipo epitelial. Além disso, reduz os processos inflamatórios, angiogênicos e cicatriciais, sem contar em sua ação antimicrobiana. Estudos demonstram que a membrana amniótica preservada é considerada imunologicamente inerte, o que a torna uma excelente opção de enxerto. O transplante da membrana amniótica foi reintroduzido na reconstrução da superfície ocular nos casos de doenças cicatriciais da córnea e conjuntiva; na cicatrização dos defeitos epiteliais persistentes; como enxerto após a remoção cirúrgica de pterígio e tumores; nas reconstruções palpebrais; e no tratamento de bolhas filtrantes com vazamento. Há estudos que apontam, ainda, que a utilização da membrana amniótica em cirurgias ocasiona um pós-operatório com pouca inflamação.
UV: Como funciona o pós-operatório e quais os cuidados necessários?
Andrade: As cirurgias de retina para abordagem de doenças vítreorretinianas eventualmente se relacionam com a infusão de gás, e quando isso ocorre, há a recomendação para que o paciente não se desloque para locais com diferença de altitude (alta ou baixa), assim como descer ou subir a serra, ou até mesmo andar de avião, pois pode haver a alteração da pressão intraocular em razão do aumento ou diminuição do gás na cavidade vítrea. Até pouco tempo era recomendação rotineira a posição de cabeça, virada para baixo, mas hoje tem-se entendido que esse cuidado não é mais necessário. Em geral, o paciente deve permanecer em repouso por uma a duas semanas e retornar às atividades físicas após 45 a 60 dias.

Fonte: Universo Visual

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