Especialistas alertam: diagnóstico precoce é essencial para evitar ambliopia e sequelas permanentes na visão
O estrabismo — desvio ocular caracterizado pela falta de paralelismo entre os eixos visuais — é uma das principais causas de perda visual evitável na infância. Embora comum, ainda é subdiagnosticado, e sua negligência pode levar a ambliopia, perda funcional irreversível da visão em um dos olhos.
Segundo Galton Carvalho Vasconcelos, oftalmologista do Instituto de Olhos de Belo Horizonte (IOBH), o tratamento precoce é decisivo.
“O desenvolvimento visual ocorre, principalmente, entre o nascimento e os sete anos de idade. Quando o estrabismo não é corrigido nesse período, o cérebro suprime a imagem do olho desalinhado para evitar diplopia, o que causa ambliopia permanente”, explica.
Estudos mostram que cerca de 3% a 5% das crianças apresentam algum tipo de estrabismo. Sem intervenção adequada, o desalinhamento interfere na visão binocular (tridimensional) e pode comprometer a percepção de profundidade — habilidades fundamentais para leitura, coordenação e aprendizado.
Consequências emocionais e sociais
Além dos impactos visuais, o estrabismo pode afetar aspectos psicológicos e sociais da criança.
“Crianças com estrabismo frequentemente sofrem bullying e isolamento social. Isso afeta diretamente a autoestima e a autoconfiança. Há evidências de que o estigma estético pode inclusive reduzir as oportunidades profissionais na vida adulta, especialmente entre mulheres”, destaca Vasconcelos.
Pesquisas recentes confirmam essa relação: um estudo publicado no British Journal of Ophthalmology observou que adultos que tiveram estrabismo não tratado na infância enfrentam maiores dificuldades de inserção social e profissional.
Risco neurológico: quando o estrabismo é um sinal de alerta
O estrabismo também pode ser a manifestação inicial de condições neurológicas ou sistêmicas.
“Como os olhos estão anatomicamente conectados ao cérebro por meio dos nervos cranianos, alterações oculomotoras podem sinalizar doenças neurológicas, endócrinas ou até tumores intracranianos”, alerta o oftalmologista.
Entre as causas secundárias estão:
- Paralisias dos nervos oculomotores (III, IV e VI);
- Traumatismos cranioencefálicos;
- Alterações endócrinas, como o hipertireoidismo (doença de Graves);
- Infecções congênitas e malformações do sistema nervoso central.
Por isso, a avaliação oftalmológica detalhada — associada a exames de imagem, quando necessário — é essencial para excluir causas neurológicas e definir o tratamento mais adequado.
Diagnóstico e sinais de alerta
O sucesso terapêutico está diretamente ligado ao diagnóstico precoce.
“Quanto antes o estrabismo é identificado, maiores são as chances de restaurar o alinhamento ocular e a visão binocular. A plasticidade cerebral infantil é um fator determinante para o prognóstico visual”, reforça o oftalmologista.
Sinais de atenção para os pais incluem:
- Fechamento frequente de um olho, especialmente sob luz intensa;
- Dificuldade para focar objetos;
- Movimentos oculares desalinhados perceptíveis em fotos ou no espelho;
- Queixas de visão dupla ou dor de cabeça.
O teste do olhinho, realizado ainda na maternidade, pode revelar indícios precoces. A recomendação é manter consultas oftalmológicas regulares, especialmente se houver histórico familiar da condição.
Causas e tratamento
O estrabismo tem origem multifatorial, envolvendo predisposição genética, erros refrativos (miopia, hipermetropia ou astigmatismo), alterações musculares, inflamações oculares ou doenças sistêmicas.
Os tratamentos variam conforme o tipo e a gravidade, podendo incluir:
- Correção óptica com óculos ou lentes prismáticas;
- Terapia ortóptica para reeducação da coordenação ocular;
- Oclusão do olho dominante (tampão) em casos de ambliopia;
- Cirurgia dos músculos extraoculares, indicada quando há desvio persistente.
“Com diagnóstico e tratamento adequados, a taxa de sucesso na correção do estrabismo infantil é alta, com recuperação funcional e estética completa em grande parte dos casos”, afirma o especialista.
Conclusão
O estrabismo não é apenas uma questão estética — é um indicador clínico importante que pode sinalizar alterações neurológicas e visuais graves. O diagnóstico precoce, associado ao acompanhamento oftalmológico regular, é a chave para garantir visão saudável, desenvolvimento cognitivo equilibrado e melhor qualidade de vida na infância e na vida adulta.
Referências bibliográficas
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