Por Luciana Rodriguez
Os dados revelam ainda que além da alta credibilidade dos médicos, a população reconhece que esses profissionais têm sua atuação prejudicada por conta da falta de condições estruturais. Entre os entrevistados, 94% acreditam que a qualidade do trabalho do médico é afetada por problemas como as precárias condições de trabalho (41%), baixos salários, corrupção na área de saúde (33%) e pela má gestão da saúde pública (28%).
Diante desse cenário, a precariedade do sistema de saúde afeta não somente a população, mas tem um impacto significativo na vida de profissionais que se dedicam diariamente ao atendimento desses pacientes. A pesquisa Great American Physician entrevistou 1.311 médicos e mostrou que 70% não têm tempo para si ou para a família. Mais da metade dos entrevistados considera péssimo o equilíbrio entre vida pessoal e profissional. Fatores como excesso de horas trabalhadas, precariedade de recursos para atendimento, baixos salários, entre outros, afetam a qualidade de vida desses profissionais com uma carga extra de estresse e cansaço.
O Censo de Demografia Médica do Conselho Federal de Medicina constatou que mais de 30% de todos os médicos brasileiros sofrem com o excesso de trabalho. Os dados revelam ainda que médicos mais jovens e com atuação na rede pública de saúde são os mais impactados pela sobrecarga de trabalho, que pode ter consequências bastante negativas, tanto no aspecto físico quanto na condição psicológica do profissional. Daí o aumento de casos, por exemplo, da síndrome de Burnout, cuja sintomatologia inclui exaustão, dispneia, insônia, distúrbios gastrointestinais, depressão, etc.
De acordo com o diretor do Hospital de Olhos de Sergipe (HOS), Mário Ursulino, os profissionais na área de saúde têm mais dificuldade para conciliar vida pessoal e profissional. “Na área da Medicina, seja quando enfrentamos cursos e concursos difíceis, que requerem muito estudo e dedicação (na oftalmologia, cerca de 11 anos); ou quando trabalhamos num ritmo intenso até a consolidação (cada vez mais tardia e árdua) profissional, ocupamos muito tempo com a profissão e sacrificamos a vida pessoal/familiar. É preciso ter um autocontrole enorme. Além do que, o médico(a) muitas vezes perde o mais importante no lado familiar: não participar ou assistir a infância, a adolescência, do seu filho! , comenta.
Ursulino ressalta que esses profissionais podem tentar melhorar esse equilíbrio entre profissão e vida pessoal definindo fronteiras entre ambas. “O expediente profissional encerra-se num determinado horário e começa o horário do pessoal/familiar. Mas sabemos que o difícil é conciliar um pós-operatório ou uma urgência fora do expediente. O profissional da saúde precisa praticar atividade física, se possível também de relaxamento, como yoga e outras, ter um lazer (hobby) para não pensar somente na profissão. Viagens periódicas programadas, pessoais e/ou familiares, relaxam e nos fazem voltar ao trabalho com mais vontade. Apesar de saber o caminho correto, nem sempre o trilhamos , adverte.
A psicóloga especializada em Gestão de Recursos Humanos e de Serviços de Saúde, Márcia Campiolo, acredita que o equilíbrio entre a vida pessoal e profissional só pode ser alcançado se as pessoas tiverem a disposição para mudar comportamentos, ou seja, mudar seus hábitos, o que muitas vezes não é uma tarefa fácil. “Sempre que buscamos o chamado equilíbrio, possivelmente será necessário fazer opções para que seja possível privilegiar a vida profissional e a pessoal de forma mais equitativa possível. Assim, podemos dizer que aceitar e praticar mudanças é uma das grandes dificuldades para alcançar esse equilíbrio tão importante para uma vida feliz , explica.
Segundo Márcia, o primeiro passo é fazer um balanço de sua vida, procurando avaliar como anda a sua dedicação com o lado profissional e o pessoal, e se elas estão em equilíbrio. Caso não estejam, é importante repensar a forma como sua vida vem sendo conduzida, o que será necessário mudar e como.
A psicóloga adverte que frequentemente, caso a dedicação ao trabalho seja intensa e desproporcionalmente em desequilíbrio em relação à vida pessoal, os que estão sujeitos às piores consequências são aqueles à sua volta: família e amigos, além se si mesmo. “Todo desequilíbrio é maléfico para a vida do indivíduo, e se propaga danosamente a longa distância. Sempre é tempo de mudar, para isto é preciso coragem e disposição para corrigir a rota e entrar no caminho onde se tem uma maior chance de ser mais feliz , aconselha Márcia.
O presidente do Instituto Brasileiro de Coaching (IBC), José Roberto Marques, alerta que é preciso estarmos atentos a alguns sinais que evidenciam problemas na conciliação de vida pessoal e profissional. O especialista ressalta o estresse, a insatisfação e a reclamação por falta de tempo. “Alguns indícios na saúde também podem ser sinal desses problemas, como aumento de peso, cansaço excessivo e insônia , disse.
“Quando não conseguimos o equilíbrio entre vida pessoal e profissional, este se reflete de alguma forma, seja em nosso físico ou psicológico. Os profissionais da área da saúde lidam com vidas, e uma boa parcela delas está em busca de cura de alguma doença ou problema. O peso da responsabilidade é muito grande, um erro pode ser fatal. Nesse sentido, são profissionais que necessitam de atenção focada, porém lidam com muita pressão e até mesmo urgências, o que os acaba sobrecarregando , explica José Roberto.
O presidente do IBC ressalta a importância de esses profissionais se organizarem para não levar as responsabilidades da profissão para seus momentos de estudo, descanso e lazer.
Por fim, José Roberto dá algumas dicas para reverter esse desequilíbrio. “Primeiramente é importante ter autoconhecimento, no sentido de identificar o que lhe traz realização, seja ela pessoal e profissional. Em um segundo momento estabeleça suas prioridades. A exemplo de trabalho, estudo e cuidados com a saúde. A partir daí parta para o terceiro passo, que é realizar o planejamento diário de suas tarefas, estabelecendo horários para cada atividade. Coloque tudo no papel. Lembre-se de definir momentos de descanso, eventos sociais, práticas de hobbies, tempo para colocar aquela série em dia, pegar um cineminha, fazer leituras, ou mesmo para ficar à toa. Dessa forma fica mais fácil visualizar o que é melhor para que tenha sucesso e equilíbrio, seja no aspecto pessoal ou profissional, e eliminar distrações e comportamentos sabotadores como procrastinação, ou momentos ociosos das redes sociais. Esses planejamentos diários devem ser feitos com base nos objetivos a longo prazo, e alcançá-los deve atender anseios profissionais e pessoais , conclui.
Fonte: Universo Visual