(https://www.economist.com/leaders/2021/09/04/the-threat-from-the-illiberal-left) que relembra uma frase de Milton Friedman sobre equidade e liberdade: The “society that puts equality before freedom will end up with neither”.
A decisão por uma ou outra prioridade é obviamente ilusória, se não restrita a espaços temporais e geográficos. Com certeza na Suécia de 2021 há liberdade de escolhas, porém na índia de 1870 (e hoje também), quem nasce em uma casta pouco pode mudar.
Parece bem claro que, ao longo da história, não houve opção de escolha sem equidade, e o que se discute de modo inteligente hoje em dia é como fazer isso acontecer. Claro que também não há simpatia pela falta de liberdade, e utopicamente as duas variáveis deveriam ser resolvidas ao mesmo tempo na equação. Missão impossível!
Mas o artigo não chega a essa reflexão muitíssimo interessante a partir da frase do Nobel e pensador da escola de Chicago, e retoma uma divisão entre liberalismo clássico e não liberalismo progressista (iliberalismo).
Uns são tolerantes com opiniões distintas e acreditam no cidadão, os outros excluem grupos que “pensam diferente” e usam o poder do estado para impor uma agenda. O artigo cita marginalmente o tamanho do estado e propriedade privada, blocos de construção fundamental da filosofia liberal.
Alguns dias depois, a nossa revista veja publicou um artigo de Fernando Schuler (https://veja.abril.com.br/blog/fernando-schuler/a-armadilha-iliberal/), aprofundando ainda mais o conceito de não-liberal, que se identificaria com “Uma questão de poder, de um lado, e de medo e exclusão, do outro”.
Não consegui parar de pensar em definições aparentemente lógicas e completamente inúteis, como o não-azul, o não-quente, etc& mas entendo muitíssimo bem que hoje em dia haja coro com as pseudo polarizações de espectros políticos, econômicos, de costumes, etc& .
Como se um grupo se definisse pelo não pertencimento a outro. Eu sou não-São Paulino/não-Corintiano/não-Flamenguista/não-Gremista & Quem eu sou ???
Me contraponho frontalmente a esse maniqueísmo explicando a frase que abre a coluna e coloquei na página da minha família (http://www.schor.com.br).
Nós fomos muitos médicos (somente uma mulher e vários homens) e muitos ativistas, gestores, pesquisadores e estudantes sociais. Isso começou provavelmente nos meus avós paternos, ele médico e ela ativista política. Ele cuidando de uma a uma – no caso o gênero também serve para as mulheres, já que ele era ginecologista e obstetra – e ela cuidando de todas (as pessoas), como mãe, esposa, irmã, tia, avó, gestora de entidades de direitos humanos e das mulheres e ativista política.
A preocupação e ação em direção a mitigar sofrimento e promover bem estar está presente nos dois lados dessa moeda, mas é realizado por ferramentas diferentes, e depende das condições impostas.
Operar um paciente com catarata não é menos importante do que defender uma política pública que permita que mais pacientes sejam operados de catarata. As escolhas são individuais, sim, e complementares. Uma não sobrevive sem a outra, não adianta ser ótima médica, se não há acesso a medicamentos. Do mesmo modo, não funciona a rede de atendimento sem enfermeiras disponíveis, e de novo, os dois deveriam vir juntos.
Avanço um pouco no papel do estado aqui. No meu modo de entender, ele conseguiu diminuir desigualdades em inúmeros locais do globo. A sociedade organizada também tem papel no nivelamento antes da partida, e o capitalismo pleno, puro, direto, aprofunda essas diferenças pela própria natureza da mais valia.
Poucos concordam que a dicotomia esteja ainda em discussão séria. Há inúmeros matizes entre um estado absoluto e a barbárie individualista.
Temos toda a história da humanidade para aprender, exemplos horríveis de fracasso e sofrimento. Podemos nos agarrar a um mote nobre, como o bem estar, e coletar ideias, experiências e temperos, para que nos inúmeros detalhes, no pensamento que agrega e evolui, construirmos nossas teorias.
E como bom cientista, não ter dúvida de que elas serão substituídas por outras melhores.
Acreditemos na inteligência e capacidade de avançar, ou como diria Fernando Pessoa, “para viajar, basta existir& “
Fonte: Revista Universo Visual