Por Flávia Lo Bello
Com o objetivo de criar mecanismos efetivos para combater fraudes e outras irregularidades na emissão de atestados médicos no Brasil, o Conselho Federal de Medicina (CFM) lançou a plataforma online Atesta CFM, que irá oferecer à sociedade serviços gratuitos de validação e chancela de atestados médicos emitidos por todo o país, uma decisão que beneficia não apenas médicos, mas trabalhadores e empregadores.
Hideraldo Cabeça, 1º secretário do CFM e responsável pelo projeto
Segundo Hideraldo Cabeça, 1º secretário do CFM e responsável pelo projeto, há um número bastante elevado de atestados médicos falsos em todo o país e, nesse sentido, a plataforma vem para proteger o médico e a própria medicina, no intuito de promover uma veracidade e acompanhamento dos atestados emitidos no Brasil. “O Atesta CFM será vantajoso para os médicos, que contarão com a proteção do seu ato profissional; para os trabalhadores, que terão a certeza de que os atestados que portam foram assinados por médicos de fato; e as empresas, que poderão verificar irregularidades em documentos fraudulentos que lhes foram entregues”, afirma.
Ele explica que o Atesta CFM integrará diferentes bancos de dados, de forma segura e com total respeito às regras da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD), possibilitando a emissão, validação e verificação dos atestados médicos. “O médico será avisado de todos os documentos emitidos em seu nome e CRM, portanto, no caso de ser emitido um atestado médico que não seja desse profissional, ele irá receber no seu e-mail um aviso de que foi fornecido o documento e poderá notificar a fraude”, esclarece Cabeça, salientando que, além de beneficiar os médicos contra fraudes, os trabalhadores poderão verificar o seu histórico de atestados e as empresas e empregadores terão a oportunidade de checar a veracidade dos atestados entregues.
Na opinião do conselheiro, a plataforma trará agilidade e praticidade para o ecossistema do trabalho. “O trabalhador não precisará entregar o atestado pessoalmente na empresa, eliminando o risco de perda do documento. Basta que ele autorize o médico a enviá-lo pelo sistema, conforme prevê a LGPD. Com isso, o empregador receberá automaticamente o documento digital”, informa, pontuando que, sem esse aval, o empregado terá de levar o atestado na forma física, em mãos, mas impresso em formulário que atenda aos requisitos do sistema.
De acordo com o secretário, quaisquer tipos de atestado poderão ser emitidos pela plataforma, como os de saúde ocupacional, afastamento, acompanhamento e, inclusive, a homologação de atestados pela medicina do trabalho. “A criação da ferramenta responde a uma necessidade da sociedade em geral, que sofre as consequências de inúmeras fraudes nesse processo de emissão de atestados médicos. Não são raros os casos de documentos adulterados ou falsificados, com o uso de informações de profissionais sem autorização”, afirma o relator do projeto.
Resolução CFM nº 2.382/2024
Atesta CFM está regulamentada por meio da Resolução CFM nº 2.382/2024
A plataforma Atesta CFM está regulamentada por meio da Resolução CFM nº 2.382/2024, encaminhada no dia 5 de setembro para o Diário Oficial da União (DOU). “Após 180 dias da publicação no Diário Oficial todos os atestados médicos deverão ser emitidos ou validados pela plataforma Atesta CFM”, declara Cabeça. A plataforma online deveria estar disponível aos médicos a partir do dia 5 de novembro, no entanto, foi suspensa pela Justiça Federal – o CFM revela que já entrou com recurso para reverter essa decisão (leia box na pág..).
O 1º secretário do CFM explica que a integração do Atesta CFM com as empresas depende de um acordo de cooperação entre a API (Application Programming Interface ou Interface de Programação de Aplicação) do Conselho Federal de Medicina com esses estabelecimentos. Há necessidade, portanto, segundo ele, das empresas procurarem o CFM. “Existe um sítio eletrônico, que é o atestacfm.org.br, no qual haverá todas as informações para as companhias proporcionarem essa integração junto ao Atesta CFM”, comenta, ressaltando que isso é obrigatório, já que em 2025 todos os médicos, sejam aqueles que utilizam a prescrição eletrônica do Conselho Federal de Medicina ou outra qualquer prescrição (na esfera privada ou pública) deverão passar para o Atesta CFM.
“Não obstante, o médico que tem uma outra plataforma de prescrição, de prontuário eletrônico, ele não está impedido de utilizar o próprio sistema que já está acostumado, desde que essa empresa tenha intra-operabilidade com a plataforma Atesta CFM, isso é mandatório”, continua o conselheiro, apontando que não haverá nenhum custo para o médico e a empresa precisará única e exclusivamente ter o API de informações entre o Conselho Federal de Medicina e a companhia que o médico tenha, porventura, a sua prescrição de documentos médicos realizados.
Ele revela que medidas de segurança e privacidade foram implementadas para garantir o respeito à LGPD e o sigilo médico. “Na plataforma Atesta CFM, todas as garantias de sigilo serão respeitadas, da mesma forma que sempre ocorreu com as orientações do Conselho Federal de Medicina, seja no formato eletrônico ou mesmo na forma em papel”, avalia Cabeça, afirmando que o CFM mantém as mesmas regras de sigilo das informações dos pacientes. “É necessário esclarecer que caberá ao paciente a decisão da liberação de informação do CID e de encaminhamento diretamente à sua empresa”, observa.
Segundo o secretário, o Conselho Federal de Medicina é uma Autarquia que determina informações legais aos médicos no Brasil, por isso foi criada a Resolução CFM nº 2.382/24 no intuito de coibir as fraudes dos atestados médicos. “Fraudes estas que causam inúmeros prejuízos aos médicos, empresas, previdência social e, em última análise, a toda população”, relata. Como diretor de Tecnologia e Informação da Autarquia, Cabeça acompanhou de perto o desenvolvimento desse projeto. “Com a implantação do Atesta CFM, buscamos enfrentar esse problema na raiz, uma vez que apenas os atestados chancelados pela plataforma serão considerados válidos”, acrescenta.
Segurança para os oftalmologistas
Paulo Augusto de Arruda Mello, professor titular de Oftalmologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-UNIFESP)
Na opinião do oftalmologista Paulo Augusto de Arruda Mello, professor titular de Oftalmologia da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM-UNIFESP), o Atesta CFM representa um novo paradigma na gestão de documentos, pois trata-se de um momento em que os atestados médicos entram no mundo virtual. “Na realidade, todos estamos caminhando nesse sentido; acredito, portanto, que os médicos estarão mais protegidos no seu exercício profissional com essa resolução, uma vez que a plataforma irá combater eventuais fraudes que possam ocorrer na autorização do número de registro no CRM destes profissionais”, afirma o especialista.
Ele diz que, nesse sistema, o médico será notificado de todo atestado no qual é utilizado o seu CRM, evitando, assim, que muitos deles sejam falsificados ou adulterados, podendo acarretar até em processo judicial. “E além de proteger o registro do médico contra fraudes e alterações de atestados, a plataforma possui, ainda, uma gestão de documentos, já que todo o histórico fica arquivado. Dessa forma, o Atesta CFM possui inúmeras vantagens, beneficiando não só os médicos, mas os trabalhadores e também as empresas em que trabalham”, avalia.
Em relação à oftalmologia, Mello diz que os especialistas recebem muitas vezes solicitações de atestados para admissões de funcionários em profissões em que a visão é muito importante. “Os oftalmologistas devem, por exemplo, informar em um exame admissional a acuidade visual do paciente, visão de cores, patologias existentes, fundo de olho etc. Com essa nova plataforma, seremos comunicados de todos os atestados apresentados e teremos a garantia de sua veracidade”, esclarece.
O oftalmologista informa que, desde 1988, pessoas portadoras de doenças graves têm direito à isenção do Imposto sobre a Renda da Pessoa Física (IRPF) incidente sobre os rendimentos relativos à aposentadoria, pensão ou reserva/reforma (militares). Dentre essas patologias, estão inclusas as cegueiras binocular e monocular. No entanto, para ter direito ao benefício, Mello explica que o paciente deve apresentar um laudo médico emitido por um serviço público de saúde e, além disso, deve obter um certificado no INSS atestando a sua incapacidade e com isso ele fica isento do IR. “Com o Atesta CFM, também fraudes desse tipo serão evitadas e, assim, esse tipo de benefício irá para quem realmente tem direito”, conclui.
Plataforma online trará diversas vantagens aos médicos
Para usar o Atesta CFM, o médico precisará acessar o site (https://atestacfm.org.br/) e preencher seus dados. Depois da autenticação, poderá emitir documentos na plataforma, inclusive os Atestados de Saúde Ocupacional (ASO), medicina do trabalho e saúde, comparecimento e acompanhamento.
Entre as vantagens do Atesta CFM para o médico estão a mobilidade, já que a plataforma e o app permitem a emissão de atestados de qualquer local, como hospitais, clínicas, consultas por telemedicina ou atendimentos domiciliares. O médico assina digitalmente e o documento é enviado para o celular do paciente, além de ficar disponível imediatamente para a empresa, desde que com autorização prévia do trabalhador.
O Atesta CFM também funcionará como uma espécie de prontuário digital do trabalhador, no que diz respeito aos atestados médicos. Por meio da ferramenta, será possível acessar todos os documentos desse tipo emitidos no nome de uma pessoa, os quais poderão ser localizados por especialidade, diagnóstico, hospital ou clínica onde foi realizado o atendimento, período ou nome do médico.
Outro benefício é que os atestados médicos emitidos pela plataforma prescricao.cfm.org.br serão reconhecidos automaticamente pelo Atesta CFM. A ferramenta também permitirá a personalização dos documentos, com a inclusão de marca, logotipo e design próprios dos profissionais ou estabelecimentos de saúde; o registro dos diferentes locais de trabalho do médico; a gestão e o histórico das consultas e atestados e o cancelamento de documentos injustificados.
Justiça Federal suspende Atesta CFM
A Justiça Federal suspendeu a exigência do sistema Atesta CFM, criado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) para emissão e validação de atestados médicos no Brasil. Na decisão pela suspensão da ferramenta, foi entendido que o CFM ultrapassou sua competência e criou monopólio digital, afetando o exercício da profissão médica.
Em contrapartida, o CFM diz que entrará com recurso, baseado em fundamentação técnica, ética e legal, contra a decisão da Justiça Federal. “No processo de desenvolvimento do Atesta CFM, a Autarquia atuou com base em sua competência legal e total respeito aos princípios que regem a administração pública e à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). Além disso, por permitir integração a outras plataformas já usadas por médicos, não representa qualquer tentativa de monopólio”, pondera o CFM.
A respeito da determinação, a Autarquia divulgou uma nota aos médicos e à sociedade, publicada em 5 de novembro, dia em que a ferramenta estaria disponível para a emissão dos atestados, na qual informa que, após ser notificada da decisão da Justiça Federal, em primeira instância, que suspende os efeitos da Resolução nº2.382/20, já se prepara para interpor recurso contra essa decisão nas esferas competentes. Para ler a nota do CFM na íntegra, acesse o link: https://portal.cfm.org.br/wp-content/uploads/2024/11/nota-atesta-CFM.pdf